29/08/2017
Um dos preços da comunicação
não violenta é a regressão da consciência para níveis pré-históricos
(obviamente incompatíveis com a manutenção de uma civilização).
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Ao se comprometer com a vida
(e inclusive Rosenberg preferia o nome “uma linguagem da vida” em vez de
“comunicação não violenta”), a CNV compromete-se inevitavelmente com a ilusão.
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A CNV se ilude ao menos duas
vezes na ontologia que faz das necessidades humanas: primeiro, quando imagina
que todas elas são “do bem” (não existe, por exemplo, necessidade de se sentir
melhor do que os outros) e, segundo, quando imagina que é possível satisfazer
simultaneamente todas as necessidades de todos (sendo que mesmo em uma só
pessoa as necessidades já se contradizem entre si, o que dirá então em uma
coletividade).
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Ou as coisas acontecem com
tranqüilidade e sem abalar a minha paz de espírito, ou não acontecem: nada vale
o meu estresse e o meu sacrifício. Vamos todos morrer e morrer sozinhos. Para que se esforçar seja lá pelo que for? Por que não relaxar e aproveitar quando
se sabe que tudo acabará um dia mesmo?
30/08/2017
Se a vida fosse uma sucessão
de prazeres, as pessoas não estariam desesperadas para lhe dar um sentido moral
e para se anestesiarem com distrações de todo tipo (serviços muito bem prestados
pelas religiões). Esse desespero é evidência de que a vida é o oposto de uma
sucessão de prazeres, e que para se aderir a ela (ser um agente da autopoiese –
simplesmente exercer seus instintos ao mesmo tempo que se tem uma metacognição)
é preciso iludir-se. Basta ser uma máquina autopoiética dotada de lucidez para ser iludido.
Igualmente, as teodiceias da autoajuda seriam
desnecessárias se o mundo fosse o que elas dizem que ele é: elas são um
perpétuo movimento de negação do conhecimento do real em prol da adesão cega a ele,
tudo isso disfarçado de “autoconhecimento” e “autoaprimoramento”. Tragicômico.
31/08/2017
Mesmo que fosse possível
provar que existem seres inteligentes “do outro lado” (num outro nível do real
ao qual não temos acesso) e ainda que esses seres se comunicam conosco (ou
seja, eles podem acessar nosso nível do real, mas nós não podemos acessar o
nível deles, conhecendo-o apenas pelo que eles nos relatam, ou eventualmente
por meio de uma viagem intermediada por eles), ou seja, mesmo que fosse
possível provar que essas pessoas que alegam entrar em contato com o além realmente estão entrando em contato com
o além, mesmo assim, dizia eu, esses seres
simplesmente não seriam dignos de confiança (assim como não o são as pessoas que alegam falar com eles): como é uma relação marcada essencialmente
por uma assimetria informacional, não temos como ratificar ou retificar o que
eles dizem (não há como validar o que dizem, como verificar o contraditório), e, portanto, se acreditamos neles
simplesmente damos carta branca para eles nos manipularem livremente. Mesmo que
esses seres existam e queiram falar conosco, eles, por uma questão puramente topológica, merecem nosso desprezo.
A questão não é que seja inútil se envolver com esse tema por ele ser obviamente falso (como pensa o ceticismo "neoateu"/cientificista), mas sim por ele estar obviamente para além de qualquer possibilidade de validação epistemológica (ceticismo, mas no sentido filosófico do termo).
A questão não é que seja inútil se envolver com esse tema por ele ser obviamente falso (como pensa o ceticismo "neoateu"/cientificista), mas sim por ele estar obviamente para além de qualquer possibilidade de validação epistemológica (ceticismo, mas no sentido filosófico do termo).
01/09/2017
Todos os caminhos levam para
fora da vida.
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O simples fato de não
entrarmos coletivamente em acordo sobre o
que somos já é suficiente para mostrar que não somos nada: se fôssemos algo
isso ser-nos-ia imediatamente cognoscível, e portanto não haveria desacordo
ontológico a respeito dessa questão. Por não sermos nada, cada um consegue
inventar e acreditar em qualquer ontologia absurda, e por isso não há
possibilidade de acordo.
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“Animais: se você ama uns,
porque come outros?”
Esse pessoal não percebe que
o amor pelos animais serve tão somente como masturbação de determinadas redes
neurais (para assim sublimar instintos)? Ele nada tem a ver com uma
deontologia.
Como se adiantasse alguma
coisa exigir coerência das pessoas em termos de uma moralidade universal quando
elas nem conseguem ser coerentes consigo mesmas... Oh pessoalzinho otimista,
hein.
02/09/2017
A propensão à adoração é
indicativa de afirmação do querer viver (adesão cega à autopoiese). Se existe ainda ascese verdadeira na
Índia (nesse lugar onde o povo adora desesperadamente qualquer coisa),
certamente ela é residual (mesmo porque se não o fosse esse país não teria a
densidade populacional que tem).
Esse papo de considerar os orientais
em geral e os indianos em particular um povo “altamente espiritualizado” é puro
marketing para vender gurus. Como as
pessoas querem acreditar que existe
alguma salvação, e como é evidente que ela não está próxima a elas, o jeito é
imaginar que ela está em algum outro
lugar (seja distante em termos espaciais e/ou temporais). O culto á Índia
que ocorre em certas subculturas no Ocidente é só mais um verbete na
enciclopédia das utopias inventadas pela humanidade.
Se o Oriente em geral e a
Índia em particular fossem tão “evoluídos espiritualmente” como esse pessoal
gosta de acreditar, eles não estariam integrados nessa maquina omnicida do
capitalismo global. Idolatrar a Índia por causa dos Vedas é tão ingênuo quanto
idolatrar a França por causa de Lacan, ou idolatrar a Alemanha por causa dos
seus muitos filósofos, ou a Romênia por causa de Cioran, etc. O vulgo é o vulgo em qualquer lugar, pouco importando os sábios que conseguiram se criar no meio
dele.
*
Quanto mais o sistema
econômico progride e quanto mais a tecnologia reificante avança, mais a maquina
omnicida da autovalorização do capital torna-se autônoma, prescindido assim de
seus operadores (os quais acreditam que a máquina trabalha para o bem estar
deles...): quanto mais nós, humanos, corremos para sermos produtivos, mais
produzimos a nossa própria redundância. Se o improvável ocorrer e tudo “der
certo” (se não nos destruirmos antes), chegará o dia em que o sistema estará
maduro o suficiente para se livrar de nós de uma vez por todas, e assim iniciar
um novo estágio no automatismo da matéria que anima o devir.
03/09/2017
Quando se aprende a olhar por
detrás das máscaras de bem resolvimento que as pessoas usam, descobre-se que
todos os seres humanos são, sem exceção, essencialmente doentes.
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