quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

XXVIII

28/09/2017

Existem sistemas de organização social menos ruins do que outros – no sentido de que esses menos ruins conseguem realizar uma gestão mais efetiva, salutar, do material humano e de sua interação com a natureza. Mas todas as formas de organização social são essencialmente ruins e fracassadas, pelo simples motivo de que estão lidando com algo essencialmente ruim e fracassado: o ser humano em particular e a vida em geral. Alguns utopistas, portanto, estão parcialmente certos: seus esforços de melhoria da condição humana até geram algum resultado apreciável – mas efêmero e muito aquém do que é o prometido (a saber, uma cura para a condição humana). Será que os utopistas se dariam aos esforços que se dão se acreditassem que os frutos de suas atividades são meros paliativos diante de uma condição humana constitutivamente incurável? Da minha parte, decido solenemente ignorar essas discussões políticas, ideológicas, ontológicas, deontológicas, e decido focar no meu bem-estar – niilismo eudemonista.


30/04/2018

2008: as coisas começaram a mais piorar do que melhorar no mundo. 
2013: as coisas começaram a mais piorar do que melhorar no Brasil.
2015: começou a ficar inviável para mim imaginar a minha vida melhorando (como cenário de futuro, a sexta extinção substituiu a singularidade tecnológica).
2018: pós reforma trabalhista, a minha vida começou a piorar de fato com o fim (em setembro) do Acordo Coletivo de Trabalho assinado em 2016.
[Escrito em 19/12/19: no segundo semestre de 2020 vai vencer o atual ACT, e agora a perspectiva é a cada ACT as coisas ficarem piores.]


22/05/2018

As pessoas que alegam estar buscando o “sentido da vida” (ou mesmo o “autoconhecimento”) em geral são pessoas que subjetivamente já se comprometeram com o “Sim” (com a afirmação do querer-viver, com a agência da autopoiese), mas que ainda não arranjaram uma metanarrativa que seja-lhes suficiente – ou seja, que consiga de forma satisfatória abafar-lhes o mal estar fruto da exaptação negativa da lucidez. Enquanto ardil dos instintos de autopreservação para burlar a exaptação negativa da lucidez, o mais importante nessas buscas não é o resultado final, mas a trajetória – a busca, a espera(nça) que mantém a pessoa agarrada à vida enquanto acredita que superará a exaptação negativa de lucidez: é o velho esquema da “cenoura do cavalo”, do objeto a que mantém o movimento de adesão por meio da promessa da satisfação. Mesmo que essa busca se apresente travestida de “expansão da consciência” ela é na verdade um esforço em fugir da exaptação negativa da lucidez (a qual existe justamente devido a um excesso de consciência em relação à animalidade desprovida de metacognição).
Para mim, que desde antes de conhecer Schopenhauer já estava seduzido pelo “Não” (e que na melhor nas hipóteses consigo chegar a uma indiferença entre o "Sim" e o "Não"), essa busca de “sentido para a vida” nunca fez... sentido.

*
Se o mundo não está nem aí para mim, porque eu tenho que me importar com ele? De onde sai o imperativo, Nietzsche? Se eu sou uma mera engrenagem em uma máquina omnicida, por que ainda por cima tenho que me sentir grato? Não que eu seja contra quem se sente grato – cada um que faça com sua vida o que quiser... Mas eu não quero agradecer, pouco importa qual seja a chantagem emocional que inventem os que não toleram a existência de gente como eu.


13/06/2018

O pensamento desejante não necessariamente atrapalha o conhecimento. Aliás, em algumas situações pode ajudá-lo: nessas situações, é graças a ele que a pessoa nota detalhes e foca a atenção em pontos que as outras pessoas não notam ou não dão a devida atenção. Às vezes é uma forçada “razoabilidade” ou “imparcialidade” que acaba gerando um viés cognitivo, e não o pensamento desejante (essa forçação não deixa também ela de ter uma origem volitiva, num bom-mocismo ingênuo). Epistemologicamente, isso apenas complica ainda mais as coisas...


24/06/2018

Vendo "Voyage of time".

Quando a mente foca em grandes escalas no tempo e no espaço, há a sensação de sublime, cujo prazer é fruto do esquecimento de si e de seus sofrimentos. Esse prazer, associado ao pensamento mágico/animista, gera uma ilusão cognitiva de "intuição" da "alma" do mundo e/ou do suposto Ser que o criou. Mas não há Ser ou "alma" alguma, apenas o desdobramento incessante da atividade das forças físicas e um sistema nervoso limitado que os observa (e que não evoluiu para essa observação, portanto não está apto a isso).


07/07/2018

Não acredito que a humanidade dure mais cem anos. E mesmo que acreditasse que ela pode durar mais alguns milênios, não acredito que irá progredir (no sentido de solucionar os paradoxos que a animam pelo menos desde o início da civilização). E mesmo que, como os tranhumanistas e outros utopistas, acreditasse que ela está predestinada à grandeza (e mesmo à divindade), por que deveria sacrificar meu bem estar imediato em nome de um futuro do qual não usufruirei?


05/09/2018

A essa altura da História (a altura da sua agonia derradeira) todas as causas são causas perdidas – exceto a causa da aceleração da vindoura catástrofe final.

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