sexta-feira, 12 de abril de 2024

XLVIII

 

27/02/24

O poder diretivo do Estado

Nossos corpos têm a capacidade de se tornarem atléticos, sarados e saudáveis. Mas, dado o contexto social em que vivemos (de sedentarismo e alimentação ultraprocessada focada no sabor e não na nutrição), cada um de nós só consegue se tornar sarado com esforço, com disciplina e com planejamento, com hábitos que nos afastam da inércia na qual o contexto nos colocou.

O mesmo acontece com um sistema social e econômico, com um país. Ele tem o potencial para se tornar desenvolvido (tem o potencial para produzir muito valor para todas as pessoas que nele estão inseridas, melhorando a qualidade de vida de todos). Mas, para atingir esse potencial é preciso planejamento, organização, disciplina, hábitos não usuais que quebrem a inércia imposta pelo contexto da divisão internacional do trabalho presente no sistema socioeconômico mundial. E para tudo isso é preciso a força diretiva do Estado. 

Um Estado mínimo produz em termos econômicos algo semelhante ao que acontece com nossos corpos se desistimos da disciplina e passamos a comer o que é gostoso e a nos entregarmos ao sedentarismo, se cedemos à pressão social (sedentarismo e alimentação ultraprocessada focada no sabor) e à pressão biológica (lei do menor esforço, procura do prazer imediato). Se queremos desenvolvimento e riqueza, não adianta retirar o Estado da equação. Entregar sistema a si próprio apenas vai gerar uma hipertrofia da situação já existente (piora da desigualdade, empobrecimento dos mais pobres, encolhimento da classe média, desindustrialização, subordinação geoeconômica e geopolítica aos países hegemônicos, etc.).

Uma pessoa não é sarada e saudável por acaso, sem esforço, sem direcionamento, sem planejamento, sem coordenação. Igualmente, um país não é desenvolvido por acaso, sem esforço, sem direcionamento, sem planejamento, sem coordenação.


01/03/24

Me deem outro universo, e então eu procriarei

Há aquela frase famosa que diz que criamos filhos para a vida (ou para o mundo), não para nós. 

Então, eu não quero criar filhos para este mundo em que vivemos. Não quero colocar no mundo alguém para ser gado destas indústrias: financeira, do entretenimento, alimentícia, farmacêutica e religiosa. Não quero colocar no mundo alguém que vai passar a vida numa luta permanente pela sobrevivência e pelo conforto, ao custo da sua própria saúde.

Para eu conseguir criar alguém que está livre de tudo isso, além de ser multimilionário eu teria que ter acesso a um sistema educacional condizente com esses meus valores. E eu nem sei se esse sistema educacional existe mesmo para os ricos. Talvez não exista.

Teria que existir um movimento ideológico que reflita meus valores (“saúdiasmo”, em uma palavra), e esse movimento teria que ser humanista e laico (nada de estar ligado a uma religião – ou seja, a um sistema de mentiras), e esse movimento ideológico teria que manter escolas, e teria que ter mais de uma dessas escolas perto da minha casa, e as escolas teriam que cobrar um preço acessível para mim. Sem isso, eu e minha/meu esposa/esposo não conseguiríamos cultivar no/a(s) filho/a(s) os nossos valores. E eu não quero ter filho/a(s) para não conseguir reproduzir nele/a(s) os meus valores. Eu não vou fazer um trabalho voluntário para reproduzir um sistema social com o qual eu não concordo. Não vou criar filhos “para o mundo”, ao menos não para esse mundo em particular que aí está.

Ou seja, não vai acontecer.


03/03/24

Espiral descendente: autopoiese da Morte dentro da Vida

aumento da entropia interna -> enfraquecimento da sintropia do self -> ações autossabotadoras -> enfraquecimento da eficácia metabólica -> estresse alostático -> enfraquecimento físico e mental -> adoecimento físico e mental -> aumento da entropia interna


07/03/24

Como ainda respiramos esse ar que não tem aroma de tutti-frutti?

Nossos antepassados viveram milênios sem açúcar e sem os demais produtos comestíveis criados pela indústria alimentícia. Também viveram milênios sem a saturação interminável de distração produzida pela indústria do entretenimento. E eles sobreviveram a um mundo que para a maioria de nós seria insuportável - como suportar respirar sem guloseimas e sem entretenimento? A maior das ironias seria se um dia fosse possível provar que, apesar dessa insuportável restrição, eles foram mais felizes do que nós...



20/03/24

O que estamos fazendo com nossas vidas?




Quando foi que nos perdemos? Cristianismo, Racionalismo Iluminismo, Divisão do Trabalho, Capitalismo e Urbanização nos levaram a uma sociedade doente, que despreza o corpo e a vitalidade. Uma sociedade na qual não há o valor da vida, não há o valor do movimento, não há o valor do metabolismo, não há o valor da alostase. Uma sociedade na qual se perdeu o ideal do ser humano integral. Uma sociedade na qual o corpo foi reduzido a uma questão estética e erótica e, por isso, é desprezado ressentidamente pelos intelectuais e pseudointelectuais, pelos eruditos e pseudoeruditos. Eles ignoram que as funções cognitivas que eles tanto gostam de cultivar e das quais se orgulham dependem do funcionamento do corpo, e ignoram que um cérebro não tem como funcionar na sua máxima potencialidade estando preso a um corpo doente. Eles desprezam o corpo. Gostariam de ser um cérebro num pote de vidro.

É claro que existem fantasias e exageros em torno da utopia da saúde perfeita (intelectuais inclusive adoram estudar esse tema), mais isso não significa que deve-se pular para o extremo oposto e esquecer do corpo e da saúde em troca de prazeres imediatos (comportamento adotado pela maioria, inclusive pelos intelectuais e pelos eruditos).

A própria esquerda perdeu o valor da saúde (se é que um dia realmente foi comprometida com ele). O que mais tem é gente de esquerda que não está se esforçando o máximo possível para ser saudável. É como se o vilão capitalismo só existisse na esfera do trabalho (da exploração dos trabalhadores), mas não existisse na esfera do consumo. Essas pessoas querem acabar com o capitalismo e ao mesmo tempo estão tomando Coca-Cola! O problema não é o símbolo que é a Coca-Cola. O problema é que essas pessoas estão gastando frações da sua parca renda para consumir algo que piora a sua saúde, em troca de um prazer sensorial, e estão transferindo valor econômico para  uma mega-corporação. É a pura e simples exploração que eles tanto denunciam. Mas como há um prazer sensorial envolvido eles não se rebelam, não buscam expulsar essa relação de suas vidas. Sonham em acabar com o capitalismo para salvar a humanidade, mas são incapazes de fazer mudanças concretas nas suas vidas para melhorar a sua própria realidade. Quer algo menos materialista do que isso? Se perdem em ideias, fantasias, enquanto os seus corpos - materiais e concretos - adoecem dia após dia.

É irônico ver como esse pessoal de esquerda ignora a saúde e como ele tem raiva do discurso de desenvolvimento pessoal (em função desse discurso ser popular entre a direita) ao mesmo tempo em que se vêem como humanistas. O que tem de humanismo em dar as costas à saúde e não querer se desenvolver pessoalmente, não querer melhorar a cada dia? 

Já eu, que não me considero esquerdista, uso todas as ferramentas que estão disponíveis para tornar a minha vida melhor, venham de onde vier. Se a esquerda "humanista" não quer falar desses assuntos, então vou procurá-lo na direita.

Esses esquerdistas adoram culpar "o capitalismo" pela piora da qualidade de vida dos trabalhadores. Mas ignoram que esses mesmo tralhadores, dentro e fora do trabalho, sistematicamente deixam de adotar hábitos saudáveis e ao mesmo tempo adotam hábitos não saudáveis. Mesmo no espaço de ação que eles possuem eles escolhem o prazer imediato, e não a saúde. E daí, quando adoecem, a culpa é só dos seus trabalhos (é só dos patrões, do capital na esfera da produção), não das centenas de escolhas ruins que eles tomam diariamente e que poderiam não tomar se priorizassem as próprias saúdes. E sim, parte da culpa por essas escolhas é sim do próprio capitalismo - agora na esfera do consumo, não do trabalho. Mas a esquerda não quer ver isso, não quer demonizar os prazeres que escravizam as pessoas em troco de suas saúdes (e, portanto, de suas felicidades). 

É mais uma versão do clássico "quer mudar o mundo mas a pia está cheia de louça". Querem que "o sistema" mude, mas aquilo que eles têm poder de mudar em suas próprias vidas eles não fazem, são incapazes de defender e fortalecer os sistemas formados pelos seus próprios corpos e cérebros. Abdicam do poder concreto - mas humilde - de ação que de fato possuem e o trocam por um poder fantasioso, mas grandiloquente. 

Talvez a maior ironia seja ver a esquerda desprezando as tentativas corporativas e da autoajuda de melhorar a saúde das pessoas. Os empregadores querem trabalhadores com um maior estoque de saúde para explorar. Trabalhadores doentes e com o metabolismo avariado rendem menos. A esquerda, em vez de aproveitar essa coincidência para lutar por uma melhoria na qualidade de vida humana, está acomodada, com medo de questionar a multidão de prazeres fugazes e que consomem a saúde das pessoas dando lucro para as empresas. A esquerda reprova automaticamente o discurso por vir dos patrões e dos coaches. Descarta-o em bloco, e, assim, abandona um dos fronts da luta humanista.

A esquerda escolhe abdicar de usar toda a subcultura da saúde e do desenvolvimento pessoal como ferramenta para lutar por uma vida melhor, só porque boa parte dessa subcultura está, no momento, nas mãos de gente de direita. 


02/04/24

Sobre a geração Z no mercado de trabalho

O neoliberalismo - um sistema anti-humano - atuou destrutivamente dos dois lados desta relação, produzindo um paradoxo.

Do lado do mercado de trabalho, levou a vagas de trabalho (sequer dá para chamar elas de "empregos", de tão ruim que são) que hiperexploraram ao mesmo tempo que oferecem remunerações baixíssimas. É um retorno ao século XIX. São vagas de trabalho tão ruins que de fato é uma opção racional simplesmente se recusar a se submeter a elas.

Do lado dos trabalhadores, o neoliberalismo criou uma geração mimada, indisciplinada, distraída, perdida em intermináveis fantasias, ansiosa, psicologicamente incapaz de lidar com a frustração, doente física e mentalmente, uma geração de indivíduos que sequer conseguiram formar uma identidade pessoal, sequer sabem quem são. Uma geração que sequer possui um estoque de saúde e vitalidade para o mercado de trabalho consumir e destruir (como ele sempre vez).

O neoliberalismo sempre foi uma força destrutiva que destrói o futuro (o longo prazo) para maximizar o lucro imediato, do presente (o curto prazo). O problema é que ele já está fazendo isso há mais de 30 anos, e o futuro que ele destruiu está se tornando o nosso presente. A conta chegou. Ele - com sua inesgotável prática de externalizar os custos para assim produzir lucro imediato - produziu uma geração inteira inapta ao trabalho, ao mesmo tempo em que produziu vagas de trabalho insalubres.


11/04/24

Acredito que mais de 80% do quantitativo de doenças da população mundial poderia ser evitado se vivêssemos numa sociedade que preza pela saúde em vez de prezar pelo lucro de curto prazo e pelo prazer imediato.

XLVII

 

21/01/24

Sobre o filme Anatomia de uma Queda

Este filme é uma declaração de ódio às ciências forenses. No mundo real, o caso teria sido solucionado pela polícia mesmo se acontecesse no Brasil, e muito mais acontecendo na França.

Não é verossímil que uma morte tão simples como essa não possa ser solucionada.

 *Não é muito usual alguém - ainda mais um homem de 1 metro e 80 cm - cair desta altura e morrer. Estatisticamente, o mais provável é que tenha sido golpeado antes de cair.

*É procedimento padrão investigar todas as possibilidades. Neste caso, havia também as possibilidades de ser um acidente, de alguém ter invadido a casa e matado o homem, e até do filho ter matado o pai. O roteiro, para simplificar, decidiu descartar essas hipóteses.

*Luminol: nos dois principais cenários da casa (o sótão e a varanda) de uma possível agressão física que produziu a lesão na cabeça, gotas de sangue teriam sido deixadas. Mesmo se tivessem sido limpadas, o luminol e outras ferramentas forenses as teriam revelado. Então, daria para saber se ele foi golpeado dentro da casa ou não. Não faz sentido isso ficar em aberto, inconclusivo, no filme.

*Cenários para a formação da lesão na cabeça. Como ela teria sido produzida pela queda? Como ela teria sido produzida por agressão de uma outra pessoa? No caso de agressão, qual a provável ferramenta? As ciências forenses seriam capazes de responder a essas questões. Mas nada sobre isso é dito no filme.

*A questão do choque com o telhado: esse choque, se ocorreu, não deixaria marcas tanto no corpo quanto no telhado (de metal)? Um homem de 80 quilos não cai de 15 metros de altura em cima de uma chapa de metal sem deixar marcas tanto na chapa quando no próprio corpo dele.

Pelas informações que o filme dá, o correto seria realmente inocentar a Sandra, em função do princípio "in dubio pro reo". Mas não é verossímil que, em pleno 2023, a investigação policial não conseguiria produzir mais informações para a tomada de decisão qualificada pelos jurados.

Enfim, não é um filme realista. Seria mais realista se fosse um filme de época que se passasse no século XIX ou até antes, pois, aí, a investigação seria mais precária do que é hoje em dia.

O cinema é uma arte ilusionista, e a diretora desse filme conseguiu enganar o público, conseguiu fazer essa história sem pé nem cabeça soar verossímil. Mesmo se tratando de um filme para um público mais inteligente (não é um blockbuster para o grande público). Entendo o ponto filosófico, até foucaultiano ("A verdade e as formas jurídicas"), que ela quis trabalhar. Mas achei uma má execução, que exige demais da suspensão de descrença.

Ironicamente, não é realizada uma anatomia da queda. Nem do sentido literal - porque aí o filme seria um episódio de CSI -, nem no sentido metafórico, pois o foco do enredo não é a derrocada psicológica do homem morto (sua "queda"), mas a construção da verdade jurídica no tribunal. O personagem masculino é um coadjuvante, o filme não é sobre ele.

Comparem com o caso Isabela Nardoni, e notem, como já naquela época e ainda no Brasil, a investigação policial produziu muito mais informações qualificadas do que a investigação do mundo fictício mostrado no filme.


25/01/2024

Impotentes, bilionários aderem ao salve-se quem puder

Encastelados em seus palácios, os bilionários - os donos do mundo! - se confessam impotentes diante do colapso que está por vir, restando-lhes apenas tentar inventar uma forma de salvarem a si mesmos.

Como Marx já dizia no século XIX, todos são escravos do capital, inclusive os capitalistas, os burgueses. Na linguagem de hoje: inclusive os bilionários. O verdadeiro sujeito é o capital e a maquinaria que ele criou para se reproduzir cegamente enquanto tiver recursos para explorar - maquinaria essa da qual todas as pessoas (inclusive os bilionários) são meras engrenagens. Maquinaria essa que está consumindo os recursos e assim continuará até eles acabarem, assim como uma máquina qualquer movida a bateria continua a funcionar até a bateria acabar. É simples, irrespirávelmente e desesperadoramente simples...


Vídeo:


https://youtu.be/mWKRBF88V4c?si=Tuk1Jh5Fx9PX3JYY

Livro:

https://www.amazon.com.br/Survival-Richest-Escape-Fantasies-Billionaires/dp/0393881067


04/02/24

O Império das Doenças

No mundo atual, só consegue ser saudável (ou menos doente) quem prioriza a saúde e, em nome dessa prioridade, diz "não" ao desfile interminável de prazeres sob a forma de mercadorias que nos são empurrados diariamente. O valor da saúde se perdeu. "Mente sã em um corpo são" se perdeu. O que importa agora é uma sucessão sem fim de prazeres imediatos (todos lucrativos para as corporações que os oferecem). O normal se tornou o patológico. Ninguém é saudável por acaso.

A única forma de ter uma saúde acima da média é cultivando, de forma acima da média, hábitos saudáveis. Hábitos de saúde mediocres levarão a uma saúde medíocre, ou seja, a uma coleção de doenças e de medicamentos que aumentam a cada ano.



17/02/24

O falso, e medíocre, equilíbrio

As pessoas costumam falar em "equilíbrio" e "moderação" em relação ao consumo de todos esses produtos alimentares. Pensam em reduzir o consumo de ultraprocessados, de açúcares, gorduras, sal, farinha de trigo, frituras, corantes, conservantes, etc, etc. E também pensam que só precisam aumentar mais um pouco os alimentos de qualidade que consomem. O problema é que elas usam como referência para o cálculo deste equilíbrio os padrões alimentares aberrantes atuais. São incapazes de imaginar toda a história da indústria alimentar, desde a criação daquele pó branco (açúcar refiando) no final do século XVIII. Daí acontece que, mesmo elas achando que estão sendo equilibradas, elas estão muito longe da alimentação ideal. O mesmo acontece com outros hábitos não saudáveis, como o consumo de entretenimento, por exemplo. A humanidade viveu milênios sem a indústria do entretenimento, mas hoje em dia as pessoas acham que já estão sendo moderadas se gastam “apenas” três horas por dia consumindo entretenimento. Quem pensa nesses termos históricos mais longos e quer retomar padrões de qualidade mais antigos em vez de se contentar com esses supostos equilíbrios acomodativos, é acusado de fanático, extremista, terrorista, de ortoréxico.


23/02/24

Por que não tenho filhos

Não sou um antinatalista, não parto de um julgamento ético sobre a responsabilidade de reproduzir ou não o sofrimento no mundo.

Por que não tenho filho(s) (resposta sintética): dados o mundo e o país atuais, dada a minha posição na divisão social do trabalho e dada a minha personalidade, avalio que para mim a relação custo-benefício é desfavorável.

Essa avaliação é uma estimativa, que só poderia ser confirmada ou refutada se eu tivesse filho(s). Mas também é verdade que se eu tivesse haveria um viés para eu me autoenganar acreditando que foi melhor ter tido (pois seria muito duro viver diariamente com a convicção de que se cometeu um terrível e irreversível erro).

Se a sociedade for colapsar porque muita gente está pensando como eu, lamento. O mundo que mude. Os bilionários e os políticos que façam alguma coisa (supondo que tenham poder para fazer...). Nós aqui embaixo só estamos respondendo aos incentivos que o sistema nos dá. E ele está dando incentivos para nós não termos filhos.

A queda na taxa de natalidade JÁ É FRUTO DO COLAPSO que está acontecendo. Os altos custos de vida já são fruto do colapso ambiental. 

Mas esse colapso está se desenrolando há décadas e ainda vai levar muitas mais décadas até que aconteça a situação que as pessoas usualmente entendem por colapso. O colapso já está acontecendo, mas em câmera lenta, ao longo de gerações



27/02/24

Sobre debates intermináveis acerca da existência de Deus

Estamos há milênios nesta cacofonia nababesca para tentar provar um suposto ser - o Ser por excelência, aliás - que, se quisesse, poderia se revelar de forma inquestionável para todos nós. Mas não quer. Ou não existe. É diferente, por exemplo, de físicos discutindo a mecânica quântica, ou quaisquer especialistas de uma área de estudo discutindo tecnicalidades. Pois eles estão tentando conhecer a natureza, que é inanimada, que não é um ser dotado de consciência e vontade (muito menos o Ser por excelência). Esse Ser ou não existe ou não se importa conosco, ou mesmo está contra nós (somos uma fazenda de formigas, ou uma plantação, alguma coisa que ele cultiva para alguma finalidade instrumental, ou mesmo somos organelas das bactérias do intestino dele). O mais provável (respeitando a Navalha de Ockhan) é que não exista, e que alguns de nós insistam em negar as evidências pois estão emocionalmente ligados a essa crença desde a primeira infância (quando receberam forte educação religiosa da família e/ou dos profissionais da religião - trabalhadores cujo objetivo é reproduzir a fé na cabeça dos outros)... Se ele existisse, ele seria um fato evidente, e discussões não seriam necessárias, muito menos discussões intermináveis.

Evidência EXISTENCIAL seria ele existir assim como uma pessoa famosa existe, assim como a cidade de New York existe. Nós não precisamos ficar discutindo se New York existe ou se Trump existe. Há evidência de que existem. É como acontece nas histórias de fantasia que inventamos (por exemplo, Harry Potter ou Senhor dos Anéis): há seres com poderes sobrenaturais, geralmente há vida após a morte. E há de uma forma inequívoca, como um fato social. Não há necessidade de ficar discutindo algo cuja existência se impõe, está evidenciada por si mesma.

sábado, 30 de dezembro de 2023

XLVI

 

28/10/23

É impressionante como daria para transformar a vida da maioria das pessoas para muito melhor se elas lessem um parágrafo por dia dA Arte da Prudência. Livro de 300 parágrafos, do século 17, em domínio público, com 100 páginas.


31/10/23

O capitalismo quer nos usar e nos jogar fora. Usar-nos intensamente como produtores e consumidores de mercadorias. Usar-nos com uma intensidade tal que consome a nossa saúde e a nossa vida. Mas tudo bem para ele, pois o mundo das mercadorias também lucra com o nosso adoecimento e com a nossa morte. Cabe a nós resistirmos, defendermos nossa saúde e a nossa vida. Porém, na condição de trabalhadores assalariados, sempre teremos que aceitar um certo nível de corrosão da nossa saúde em troca do privilégio de estarmos bem empregados. Cabe a nós nos disciplinarmos para que a erosão de nossa saúde seja minimizada. Eliminar a zero essa erosão, ou até torná-la negativa, só é possível para quem atingiu a independência financeira.


07/11/23

Alimentação saudável, higiene do sono, prática regular de exercícios físicos, higiene mental, vida organizada, inteligência financeira, desenvolvimento pessoal... Trabalhar para melhorar nessas áreas implica numa melhoria de qualidade de vida para qualquer pessoa, seja autista ou não. 

Talvez não adiante muito saber sobre o autismo e sobre o quanto a sociedade precisa mudar para podermos viver melhor nela e ao mesmo tempo ignorar esses aspectos importantes para a melhoria da qualidade de vida de qualquer pessoa.

E nesse mundo cheio de distrações, não há como conseguir focar em todas essas áreas sem muita disciplina e sem dizer não para os prazeres imediatos que nos são oferecidos o tempo todo pelos vendedores capitalistas. O sistema nos usa para realizar os lucros. A capitalismo não está aqui para atender as necessidades humanas (como está escrito em qualquer livro de introdução à Economia), são as pessoas que estão aqui para atender a necessidade do capitalismo. Somos usados e descartados e nesse processo somos fonte de lucro na produção e no consumo das mercadorias, mesmo ao custo da nossa saúde, pois o sistema também lucra com nossas doenças e com nossa morte, já que elas também são ocasiões para a venda de mercadorias. Se queremos defender a nossa saúde e a nossa vida, precisamos resistir à sedução do mundo das mercadorias, aos cantos das sereias mercantis.


15/11/23

Motivos para o fim do sexo (todos, exceto o último, ligados ao capitalismo tardio)


*Hegemonia do mundo das mercadorias: A libido das pessoas se canaliza para o trabalho (produção de mercadorias) e para o consumo de mercadorias (incluindo as de entretenimento, que existem num montante muito maior do que alguém consegue consumir). A insegurança laboral exige um esforço de permanente busca de qualificação e atualização, pois nunca se está qualificado o suficiente. Enquanto isso, o sexo real é reprimido por puritanismos (como sempre foi), tanto de esquerda e de direita. Ou seja, há muitos incentivos sociais para não se engajar no sexo e, ainda, incentivos para se afastar do sexo. Não há publicidade para o sexo real, pois ele não é uma mercadoria. A desaparição do sexo é apenas um epifenômeno de um mundo saturado de mercadorias e focado na valorização do capital por meio dos humanos, e não focado em trazer qualidade de vida e de relações para os humanos. Ou seja, um mundo capital-ista, e não social-ista ou human-ista.

*Por causa das redes sociais e dos conteúdos áudio-visuais, por causa do semiocapitalismo, há uma saturação de contatos com os humanos, mesmo que sejam contatos de péssima qualidade. Essa saturação gera uma aversão à intimidade, uma incapacidade de suportar a intimidade, um desinteresse em desejar a intimidade. A profusão de telas gera uma hiperestimulação do visual em detrimento dos outros sentidos. Audição e paladar também conseguem ser bem explorados pelo mundo das mercadorias. O sentido menos experimentado e menos desenvolvido é tátil, por ser o mais difícil de ser explorado mercantilmente. A falta de experiência com esse sentido leva, no indivíduo, a sua atrofia e ao medo de explorá-lo: melhor se acomodar no que já está conhecido e estimulado pelo capitalismo.

*Exposição precoce e em grandes quantidades à pornografia. Confundir pornografia com realidade, estabelecendo um padrão inatingível. A pornografia (conteúdo audiovisual para masturbação), na medida em que é facilmente mercantilizada, não poderia deixar de também ser abundante e contribuir para a saturação de contato virtual com o humano e para o estímulo ao isolamento narcísico do indivíduo num mundo de fantasias no qual ele não precisa se arriscar a se relacionar com o outro. É muito mais fácil viver num mundo fantasioso de masturbação no qual o outro é um mero simulacro do desejo do próprio multivíduo desejante. Não há resistência, atrito, contrariedade, intimidade, desconforto, dificuldades de comunicação, negação em atender a demanda, etc.

*Crise da masculinidade. Os homens são estimulados a serem menos masculinos, mas as mulheres continuam a desejar secretamente "homens de verdade". Isso gera um aprofundamento do desencontro entre homens e mulheres.

*Como essa morte do sexo se trata de um processo social e como o sexo depende da interação com o outro, fica muito difícil para alguém encontrar um outro alguém que queira se esforçar para resistir a essas pressões sociais e queira ter relações sexuais de qualidade. Quando estamos falando de essencialismo, de estoicismo, de eudemonismo, de higiene mental, de alta performance, etc., estamos falando de práticas nas quais a pessoa pode se engajar sozinha, independentemente dos outros ao seu redor. Mas, nesse caso do sexo, ela precisa necessariamente achar alguém (por quem ela seja atraída sexualmente, e vice-versa) que tenha esse mesmo interesse de resistir a essas pressões sociais e se engajar na construção da intimidade por meio de relações sexuais de qualidade. E isso gera uma dificuldade adicional.


28/11/23

Saúdismo.

"Que tempos são estes, em que temos que defender o óbvio?" (Bertolt Brecht)


Mens sana in corpore sano, um ideal que tragicamente se perdeu neste mundo no qual os humanos são meras ferramentas de um maquinismo pantagruélico.

Vida simples e de alta performance. Foco na saúde. "Saúdismo" 

1. Saúde física

1.1. Exercícios

1.2. Alimentação

1.3. Sono

- ritual do sono

1.4. Consultas médicas

1.5. Autocuidados (higiene pessoal, profilaxias, segurança, prevenção, etc.)

2. Saúde mental

2.1. Desenvolvimento pessoal

- Eudemonismo

- Estoicismo

- Epicurismo

- Cinismo

- Essencialismo 

- Pragmatismo

- Maquiavelismo

- Inteligência Emocional

- Inteligência Positiva

- Tomada de Decisão

- Organização Pessoal

- Produtividade 

- Clássicos da autoajuda

- Comunicação

- CNV

- Persuasão, influência, sedução, manipulação

- Liderança 

- Hábitos 

2.2. Psicologia

- Conhecer o básico de psicologia e de neurociências (Priorizar as Práticas Baseadas em Evidências)

- Fazer terapia

- Gestão do estresse e da ansiedade 

- Psicologia Positiva 

2.3. Praticar Mindfulness 

2.4. Cultivar bons relacionamentos

2.5. Ter uma boa vida sexual

2.6. Organização da vida 

2.7. Diversão 

3. Saúde Financeira 

3.1. Ganhar dinheiro

3.1.1 trabalho

-- entregas

-- jogo político

-- Networking 

-- currículo

-- melhoria contínua

-- aprendizagem contínua

-- conhecimento crítico sobre a exploração do trabalho no capitalismo 

-- etiqueta corporativa

-- cultura corporativa

3.1.2. investimentos

-- conhecimentos teóricos e práticos

3.2. Poupar dinheiro

- minimalismo

- inteligência financeira

- conhecimento crítico sobre o capitalismo, sobre o marketing e sobre a publicidade

- conhecimento sobre golpes, sobre segurança e sobre cibersegurança.


08/12/23

Sinto-me mais à vontade sob a subcultura coach do que sob a subcultura do mimimi.

....

Os desejos e as fantasias de uma pessoa podem se espalhar por um espectro dividido em basicamente 4 níveis:

1. Desejos que são factíveis. Podem ser desafiadores, mas são factíveis, como são os objetivos SMART.

2. Desejos que até são factíveis, mas que são altamente improváveis. Por exemplo, desejos que dependem da pessoa ganhar na loteria.

3. Desejos que são humanamente possíveis, mas são impossíveis para a pessoa em particular, mesmo com todo dinheiro do mundo.

4. Desejos que são humanamente impossíveis para qualquer ser humano.


Quem busca praticar o pragmatismo, o realismo e o essencialismo concentra seu foco em desejos e fantasias que estão no primeiro nível.

Focar nos outros níveis leva ao sofrimento da reiterada frustração, podendo, inclusive, levar à depressão, ou à manutenção de uma depressão já estabelecida.


09/12/23

Por que não sou comunista


1. Não acredito na ideia de progresso que anima o iluminismo e esta derivação específica do iluminismo que é o comunismo.

2. Não compartilho da ontologia da natureza humana que o marxismo possui e que o próprio Dicionário do Pensamento Marxista confessa que é uma ontologia otimista. Novamente, um aspecto que o comunismo herdou do iluminismo e que eu renego.

3. Acredito que a humanidade estará extinta em menos de 100 anos, ao mesmo tempo em que não acredito que daria tempo para o processo civilizacional superar o capitalismo em menos de 100 anos. Em outras palavras, acredito naquilo que os comunistas tanto gostam de denunciar: o chamado "realismo capitalista". Realmente é muito mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo. Eu mesmo já fiz uma lista aqui (no dia 11/12/21) com mais de 35 caminhos para o fim do mundo ("Caminhos seculares para o fim do mundo"). Da forma como eu vejo, é como se a civilização e a própria espécie humanas fossem semelhantes a uma pessoa que está amadurecendo, mas que acaba morrendo de velhice antes de chegar à plenitude da maturidade, antes de resolver seus problemas: as contradições que animam a dialética histórica humana não se resolverão a tempo da morte da história humana acontecer por falta de substrato material. A minha visão é mais materialista do que a dos marxistas. O materialismo dos marxistas está focado por demais na sociedade, eles não percebem o quanto as próprias existências da sociedade e mesmo da espécie humana dependem de uma materialidade finita que está sendo diuturnamente dilapidada. Estão presos a um materialismo do século XIX e presos na crítica cultural, esquecendo que essa cultura depende de corpos, e que esses corpos dependem de uma série de recursos naturais que são finitos e que estão em rápido (rápido em termos geológicos) processo de indisponibilização. Não entendem nem querem entender de ecologia, biologia conservativa e ciências da Terra, pois são pessoas "de humanas". Estão mais interessados em discutir qualquer questão cultural do que se envolver nos estudos desses assuntos fora das humanidades. O máximo que fazem é anexar o tópico da sustentabilidade sem se aprofundar nele, criando, por exemplo, o ecossocialismo, ou fazendo profecias do tipo "Socialismo ou Extinção". Não, é extinção mesmo, com ou sem socialismo.

4. Os exemplos de socialismo real. Embora eu acredite que eles foram melhores que os capitalismos em alguns aspectos (inclusive no aspecto da sustentabilidade ambiental), convenhamos que estiveram longe de ser uma maravilha, longe de ser algo que faça o sacrifício pessoal por eles parecer valer a pena. E perderam a guerra contra o capitalismo. Se eram superiores, porque não venceram? O comportamento dos comunistas em relação a esses exemplos de socialismo real também é difícil de lidar: uns renegam dizendo que se tratam de capitalismo de Estado, enquanto outros insistem em dizer que lá tudo era (ou é) muito melhor do que no capitalismo. Seja como for, parece-me que não vale a pena lutar para cair num regime como esses que existiram ou que ainda existem. Parece-me um esforço que não entrega o que promete. Talvez porque nem seja possível entregar a promessa, pois se trata de uma utopia, incompatível com a natureza humana? E se a tentativa de produzir o comunismo já gerou esses modelos de sociedade uma vez, porque não geraria de novo numa nova tentativa? 

5. Por falar em natureza humana, esses marxistas, como pessoas "de humanas", têm enorme dificuldade em aceitar os fatos científicos sobre a natureza humana. Talvez porque, se aceitarem, vai ficar difícil sustentar o otimismo ontológico do qual depende a utopia que eles acreditam? Eu entendo que um exagero do biologismo foi usado no passado para defender ideologias eugênicas, e que ainda hoje em dia seja usado em ideologias burguesas, mas isso não significa que podemos simplesmente jogar fora a ontologia biológica. A verdade, para mim, é que a sociobiologia está mais epistemologicamente e ontologicamente correta do que o próprio marxismo.

6. O wishful thinking dos comunistas, que é o mesmo dos prosélitos de qualquer ideologia-utopia: ficam torcendo os dados para que corroborem suas crenças, tanto sobre o que o mundo é, quanto sobre o que ele deveria ser, quanto, ainda, sobre o que ele será.

7. Meu pragmatismo e meu essencialismo: busco economizar meus recursos escassos e alocá-los em atividades ligadas à minha saúde (física, mental e financeira), e não em intermináveis discussões sobre o que o mundo é, o que ele deveria ser e o que ele será.

8. Sou cético, sou um pessimista ontológico e um niilista passivo. Não tenho vocação nem para profeta nem para mártir. Mesmo que a humanidade durasse mais séculos ou milênios, acho que os cenários mais prováveis seriam os que ainda manteriam a dinâmica de explorados e exploradores, conforme descritos por muitas ficções científicas (por exemplo, Warhammer 40.000). O único otimismo que eu tenho é na gestão da minha própria vida, naquilo que está sob meu controle. Neste aspecto, sou um eudemonista, misturando aspectos do estoicismo, do cinismo, do epicurismo, do maquiavelismo, do desenvolvimento pessoal, do essencialismo, da psicologia positiva, etc. Para mim, o mundo seria um lugar melhor se todas essas pessoas (de todas as ideologias e religiões) que estão militando para mudar o mundo estivessem se esforçando para serem pessoas melhores, com mais saúde física e mental. Mas, em vez disso, elas preferem entrar em aventuras quixotescas para impor aos demais aquilo que elas acreditam que seria a salvação do mundo, o que, ironicamente, deixa o mundo ainda pior (e isto é um exemplo de iatrogenia).

9. Para mim, essas ideologias e utopias (não só o comunismo, mas as demais, tanto à direita quanto à esquerda, e inclusive as religiões) servem mais para cumprir um papel de muleta psicológica. Ajudam as pessoas a suportarem a vida, pois lhes permite sonhar que um dia as coisas serão melhores. Para mim serão piores e rumo à extinção. Eu busco focar não em sonhar com um mundo melhor, mas em mudar o que de fato está ao meu alcance de ser mudado na minha vida, dentro do sistema social como ele é e está. Não me atribuo um papel de trabalhar pela melhoria do mundo, pois viver a minha vida da melhor forma possível já é desafiador o suficiente. Diferentemente destas pessoas, eu não me atribuo um papel de transformador social, de propagador da minha boa nova. Sei que não adianta querer forçar. Posso até ajudar alguém que pedir, mas quase ninguém pede. Como o próprio Baltazar Gracián diz, "ainda que sejam raros os oráculos de sensatez, vivem ociosos, porque ninguém os consulta" (parágrafo 176 d'A Arte da Prudência). Para mim, o foco na saúde já basta como forma de resistência ao capitalismo tanto na esfera da produção quanto na esfera do consumo. Focar na própria saúde é algo muito mais concreto (e material) do que sonhar com um novo mundo. Cansei de ver gente de esquerda com a saúde em frangalhos e refém da indústria alimentar, da indústria farmacêutica e da indústria do entretenimento. Acredito que essas pessoas estariam melhor se focassem em cuidar mais das suas saúdes, em vez de militar por um mundo melhor. Mas não me atribuo um papel de instruí-las. As informações estão aí, disponíveis, mas essas pessoas não se interessam por elas; não sou eu que vou forçá-las a se interessarem.

11/12/23

Dória foi um visionário com aquele acinte da "farinata". Ele esteve décadas à frente do seu tempo. Um dia, essa comida liofilizada feita com alimentos próximos do vencimento será corriqueira no nosso dia-a-dia, junto com as farinhas de insetos. Os pobres e a classe média vão se empanturrar com essas rações humanas.


22/12/23

Comemos para subsidiar os processos alostáticos necessários para a autopoiese da sintropia dos sistemas complexos que são os nossos corpos. Incluindo-se nos corpos os cérebros e, por extensão, os epifenômenos dos cérebros conhecidos como mentes.

XLV

 20/05/23

Eu aceito tudo.

"Escolha suas batalhas". Eu escolho cuidar de mim, da minha saúde (física, mental e financeira). E só essa prioridade já consome mais recursos que eu tenho. Quanto ao futuro político do mundo e do Brasil, eu aceito tudo: do Ancapistão à ditadura do Partido Comunista Chinês, do Império Trans à Teocracia, do Evangelistão do Pó ao Socialismo Bolivariano, do Império Anglosionista à Quarta Teoria Política. Aceito tudo, adapto-me a tudo. Não tenho com o que me preocupar. Tudo é possível e todos têm razão.


01/06/23

A vida (tao): autopoiese (yang) da sintropia (yin) de sistemas proteicos complexos.


15/08/23

O custo da ignorância.

Quanto mais o mundo vai se fechando numa grande máquina burocrática cheia de regras e de golpistas em busca de trouxas para explorar, eu acredito que cada vez menos é verdade aquele chavão que diz que “a ignorância é uma benção”. De fato existe um tipo de conhecimento que atrapalha a vida, a respeito do qual é melhor ser ignorante, mas paga-se um alto preço pela ignorância a respeito de uma série cada vez maior de conhecimentos prático necessários para ter uma vida o menos ruim possível nesta distopia.


29/08/23

O problema não é a burrice e a ignorância, mas a arrogância. Se as pessoas tivessem a humildade de admitir sua não qualificação para decidir, e se deixassem a decisão para os especialistas de cada assunto, o mundo seria menos ruim do que é. Essa arrogância está dentro do que Greene chama de Lei da Grandiosidade (11a Lei da Natureza Humana), e está dentro da pressa de concluir que Cioran denuncia.


24/10/23

A vida é tão dura e limitada no espaço e no tempo. Precisamos despender um esforço enorme e contínuo para simplesmente termos bons resultados nas dimensões mais básicas das nossas vidas: termos saúde (mental, física e financeira), segurança, bons relacionamentos, conforto e dignidade. Se escolhemos ter filho(s), então, o esforço é ainda maior, pois temos que prover tudo isso para ele(s) e ainda temos a responsabilidade moral de educá-lo(s) para ter(em) condições de ser(em) a(s) melhor(es) versão/ões dele(s) mesmo(s).

Quanto mais escolhemos nos distrair com fantasias (entretenimentos, infotenimentos, turismo intelectual, dilentantismos, drogas químicas e semióticas, ideologias, utopias, doutrinas, esoterismos), mais dificultamos as nossas próprias vidas, pois estamos escolhendo desperdiçar os nossos recursos escassos (tempo, dinheiro, energia, foco, paciência, processamento cerebral, etc.) com atividades que não apenas não contribuem como até atrapalham essas dimensões mais básicas de nossas vidas.

E quanto pior estão essas dimensões mais básicas das nossas vidas, mais sedutoras nos soam essas fantasias, pois mais desagradável está a nossa vida de fato. Mas quanto mais fugimos da realidade pior ela fica, não apenas porque não estamos trabalhando o máximo possível para melhorá-la, mas também pelo puro e simples contraste dela com as fantasias: o mundo real e a nossa vida real ficam cada vez mais insuportáveis, e nos afundamos num processo suicídico, mesmo que se arraste por décadas.

São hábitos. Se focamos pragmaticamente na vida, adiando a gratificação, teremos melhores resultados nela, o que a tornará melhor. Se focamos irresponsavelmente nas fantasias, no prazer imediato oferecido pelos onipresentes vendedores capitalistas, estamos fortalecendo as fantasias em nossos cérebros e enfraquecendo a realidade, ficando, portanto, menos aptos a (sobre)vivermos nela.

Claro que a distração, a diversão e o ócio têm um papel na saúde mental, mas o semiocapitalismo os caricaturizou e os transformou em drogas ao ponto de que perdemos a noção do que seria moderação, assim como a indústria alimentar fez com o açúcar, com o sal e com a gordura. Como sempre no capitalismo, viramos mero instrumentos para a realização do lucro, consumidores para as mercadorias produzidas e que precisam ser vendidas e consumidas a todo custo, para fazer a máquina girar. A "era da informação" não poderia, sob o capitalismo, virar outra coisa que não a era das drogas informacionais: como os capitalistas, assim que tivessem as condições tecnológicas para fazê-lo, iriam se abster de explorar as fraquezas humanas em troca do lucro fácil? Não precisam de nenhuma conspiração diabólica e de longo prazo para os estimular, pois os lucros trimestrais são estímulos mais do que suficientes. Que culpa o capitalismo tem que os lucros são mais rápidos e fáceis explorando-se em massa os pontos fracos da natureza humana? Se os lucros fossem mais fáceis explorando-se em massa os pontos fortes, o capitalismo faria isso. Mas não são. Pensando em termos das neurociências, os pontos fracos estão associados ao sistema rápido (instintivo), enquanto os pontos fortes estão ligados ao sistema lento (racional). Explorar (instrumentalizar) o sistema rápido permite uma aceleração do ciclo de produção, venda e consumo das mercadorias, acelerando o ciclo de autovalorização do capital. Embora seja possível lucrar com o sistema lento  e o capitalismo lucra com ele , o volume e a velocidade são menores do que os que se consegue explorando o sistema rápido. Não é necessária nenhuma conspiração maligna para levar a isso, nenhum plano de extermínio em câmera lenta do gado humano ao longo de décadas ou séculos.

Decisões fáceis (dizer sim aos prazeres imediatos oferecidos pelos vendedores no capitalismo), vida difícil (corrosão suicida da saúde física, da saúde mental, da saúde financeira, da qualidade dos relacionamentos, da segurança, do conforto, da dignidade); decisões difíceis (dizer não às fantasias e focar pragmaticamente em aprimorar diuturnamente a própria vida), vida fácil, ou, ao menos, vida menos difícil (mais saúde física, mais saúde mental, mais saúde financeira, melhores relacionamentos, mais segurança, mais conforto, mais dignidade). 


26/10/23

No mundo atual, para tentar reduzir os danos que o trabalho assalariado causa à saúde é preciso ter uma vida estoica e espartana. Mas para isso é preciso dizer não aos sonhos de consumo da insiderness de classe média: as viagens, os carros, os imóveis, os jantares, os pets, os filhos... Para eliminar esses danos, só atingindo a liberdade financeira.

Mas esses insiders iludidos, aceitam, sem perceber, acabar com suas saúdes em busca de dinheiro para comprar ou alugar insígnias de status.


27/10/23

Para se dar bem na vida, não adianta ser apenas inteligente. É preciso saber aplicar a inteligência nos assuntos certos, ou seja, de forma eficaz. E para isso é preciso aplicar a inteligência ao próprio processo decisório tomado sobre onde aplicar a inteligência.

Como há muito mais conhecimento no mundo do que alguém, por mais inteligente que seja, consiga absorver, invariavelmente qualquer pessoa, mesmo se muito inteligente, vai ser especialista em alguns assuntos e nos demais será medíocre ou até abaixo da mediocridade.

O problema é que muita gente inteligente não aplica a inteligência para escolher de forma otimizada os assuntos nos quais aplicará a própria inteligência. Os assuntos são escolhidos por moda, por vaidade, por status, por pressão do grupo, por afinidades eletivas, pela influência de pessoas próximas, pela sedução dos vendedores onipresentes no capitalismo, etc. Aí essas pessoas inteligentes  que demonstram sua inteligência dominando os conhecimentos nos quais focaram a inteligência  acabam vivendo vidas erráticas e desastradas, pois não decidiram buscar uma sabedoria de vida, ou ao menos um pensamento gerencial (estratégico, pragmático) a respeito da própria vida. São pessoas inteligentes tomando decisões não inteligentes a respeito de aspectos cruciais das suas próprias vidas.

Isso é muito comum em insiders (a maioria das pessoas), que não ousam questionar as convenções sociais e aí se sacrificam nas muitas armadilhas da vida mainstream, e também é muito comum em autistas (muitos dos quais são insiders), cujos hiperfocos (geralmente formados na infância ou na adolescência) quase sempre são fúteis, inúteis e desconectados da cotidianidade da qual, na verdade, eles (autistas) querem até mesmo fugir. E, ainda, é muito comum nas gerações a partir da Y, afogadas num oceano sem fim de entretenimento.


Note que tudo o que foi escrito acima está dentro do que os coaches esotéricos descrevem criticamente como "pensamento de escassez". Eles defendem o oposto, o "pensamento da abundância" (baseado na infante e infame Lei da Atração). Além desse pensamento da abundância cumprir a 32a Lei do Poder ("Desperte a Fantasia das Pessoas"), ele, uma vez transformado em verdade na cabeça dos clientes desses coaches, cria a base para justificar os preços exorbitantes do cursos e produtos que os próprios coaches vendem para os clientes. De forma semelhante, pastores da teologia da prosperidade convencem seus rebanhos a entregarem vultosas quantidades de dinheiro (incluindo carros e imóveis) para "Deus", em troca da promessa de que quanto maior o sacrifício maior será a recompensa. São diferentes segmentações do Mercado da Picaretagem, o qual trabalha com a exploração do pensamento mágico.