sábado, 23 de setembro de 2017

XXVII

10/09/2017

Eu consigo detectar a vontade de potência em ação até em uma coelha (de estimação de um amigo) – fêmea, vegana, sem metacognição e livre de quaisquer ideologias...



11/09/2017

Tem gente que tem certeza que existe Deus; tem gente que tem certeza que não existe. Tem gente que tem certeza que há “vida após a morte”; tem gente que tem certeza que não há. Tem gente que tem certeza que o ser humano é, em essência, moralmente bom; tem gente que tem certeza do exato oposto. Etcétera. Convicções não possuem valor epistemológico.

12/09/2017

Por mais disparatadas que sejam as ontologias das pessoas, a maioria delas é compatível com um funcionamento minimamente razoável dentro da sociedade: podem diferir muito na teoria, mas na prática atendem razoavelmente ao mesmo fim: propiciar a adesão à autopoiese (da vida e, junto com ela, da sociedade com seus respectivos poderes estabelecidos).


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13/09/2017

Morreremos todos sozinhos – e iludidos.

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O método científico até consegue se aproximar do Real – mas ao preço de destruí-lo, esquartejá-lo para analisá-lo objetivamente. Não é por acaso que a ciência casa tão bem com o capitalismo e que, juntos, promovem a maior devastação que já houve na história da vida nesse planeta. Mas os idólatras da ciência (dentro dos quais estão quase todos os “neoateus” e quase todos os divulgadores científicos) se recusam a ver isso, dizem que a ciência é neutra e nada tem a ver com o uso que os humanos fazem com suas descobertas...

14/09/2017

Na minha ontologia, suicídio é afirmação ou negação da vida?
Schopenhauer diz que é afirmação, Cioran diz que é negação. E eu, digo o quê? Para mim o suicídio é fruto dos mecanismos psíquicos que buscam fugir do sofrimento. Dá para dizer que ele é negação do sofrimento. Mas se é negação ou afirmação da vida, isso depende do mapeamento cognitivo da pessoa que se mata (ou cogita se matar): se o mapeamento diz que não há nada após a morte, então é negação; se diz que a vida continua, mudando só o locus ocupado pela consciência da pessoa, então é afirmação. O mecanismo biológico que busca reduzir o sofrimento é cego, não possui uma gnose, não sabe o que tem do outro lado – esse conhecimento (essa crença) é terreno do mapeamento cognitivo.
Talvez a espiritualidade pós-moderna esteja contribuindo mais para o aumento dos suicídios do que o usualmente vilanizado ateísmo/niilismo/ceticismo/materialismo: não porque seja a rigor mais danosa nesse quesito, mais por ser mais popular mesmo. Ocorre que nessa espiritualidade cada um inventa a neurose que lhe convém (se afastando das neuroses (religiões) dominantes), embora em geral o faça, por questão de economicidade (e de falta de criatividade), por meio de um pastiche das doutrinas populares, quer religiosas, quer filosóficas, quer esotéricas, quer de autoajuda, etc. Ao afastar-se da coerção de uma doutrina já pronta e estabelecida/defendida por uma instituição, a pessoa acaba forjando uma espiritualidade cujo objetivo central termina sendo o de legitimar as escolhas que ela faz – inclusive, se for o caso, a escolha de se matar. O Deus particular da pessoa acaba fazendo um papel de superego invertido, ou, mais exatamente, um pseudosuperego, que é na verdade o ego fingindo para si mesmo ser um superego. Enquanto no caso da neurose universal/institucional há uma coerção para que a pessoa não se mate, na neurose particular a espiritualidade acaba por validar até a decisão de terminar com a própria vida: não é a falta de fé que mata nesse caso, mas a recusa em se submeter à repressão de uma religião organizada.

15/09/2017

Se o mundo depende do meu esforço para ser salvo, então ele já está condenado. Não movo um único átomo em prol de um mundo melhor.

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Cada fez fica mais perceptível para mim como cada um de nós vive preso em uma realidade particular construída em nossa própria cabeça. Essa percepção já aparecia nos primeiros capítulos do Outsider à beira do abismo, e foi se fortalecendo através dos anos, até se estabelecer em definitivo quando decidi estudar Cioran.

16/09/2017

Honestamente, acho que já cheguei ao ponto no qual já sou mais saudável (física e mentalmente) do que a média da população. O ideal do outsider saudável (aventado em algum capítulo do Outsider à beira do abismo, não lembro qual) foi atingido com sucesso.

17/09/2017

Gurus e a vontade de potência
Além da ideologia-utopia, e da idolatria, o que move aqueles que querem ser gurus é a vontade de potência, o desejo de ser o macho/fêmea alfa de um bando. E é justamente o macho alfa (que Freud identificou com o além-do-homem nietzscheano), surgido muito antes do Homo sapiens, a figura arquetípica que alimenta esses sonhos de “liderança”, de “influenciar pessoas”. No fundo o que querem é o controle total (ideológico, psicológico, laboral e até sexual) sobre um grupo de pessoas – e, se fosse exequível, sobre toda a humanidade. Por mais nobres que acreditem ser suas intenções, nunca conseguem se livrar totalmente desse tipo de anseio, mesmo que às vezes o escondam de si mesmos. Quanto mais consciente são desse objetivo, mais eficientes são em manipular os outros: são esses aqueles casos típicos de seitas na qual o líder praticamente escraviza seus seguidores, e inevitavelmente acaba por cometer abusos sexuais contra alguns.
Talvez haja alguns (aspirantes a) gurus que são tão comprometidos com a ideologia-utopia que, ao menos inicialmente, consideram a liderança como um fardo, mas provavelmente acabam cedo ou tarde se corrompendo pelas delícias do poder. Já outros, justamente os mais maquiavélicos, querem só o poder mesmo, e sabem muito bem disso; para eles a ideologia-utopia é só um chamariz para os incautos a serem escravizados.
Mas o arquétipo do macho alfa não afeta só o imaginário daquele que quer ser líder, afeta também o daqueles que querem ser rebanho: por mais que haja uma aparência de democracia e de igualdade, boa parte das pessoas anseia por ser liderada, por alguém que tome as decisões e se responsabilize por isso. Servidão voluntária, ou, mais provavelmente, inscrita em nossos genes.

18/09/2017

Cada um na sua, e todos (cada um a sua maneira) contribuindo para a extinção da humanidade. “Ain, eu busco ser parte da solução, e não do problema”. Se você realmente busca isso, o melhor então é se matar (ou ao menos não ter filho(a)(s)).

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O campo do esoterismo (pensamento religioso, espiritualidade) é o campo ilusório por excelência – e justamente por isso é o melhor espaço de trabalho para os charlatães.

domingo, 3 de setembro de 2017

XXVI

29/08/2017

Um dos preços da comunicação não violenta é a regressão da consciência para níveis pré-históricos (obviamente incompatíveis com a manutenção de uma civilização).

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Ao se comprometer com a vida (e inclusive Rosenberg preferia o nome “uma linguagem da vida” em vez de “comunicação não violenta”), a CNV compromete-se inevitavelmente com a ilusão.

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A CNV se ilude ao menos duas vezes na ontologia que faz das necessidades humanas: primeiro, quando imagina que todas elas são “do bem” (não existe, por exemplo, necessidade de se sentir melhor do que os outros) e, segundo, quando imagina que é possível satisfazer simultaneamente todas as necessidades de todos (sendo que mesmo em uma só pessoa as necessidades já se contradizem entre si, o que dirá então em uma coletividade).

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Ou as coisas acontecem com tranqüilidade e sem abalar a minha paz de espírito, ou não acontecem: nada vale o meu estresse e o meu sacrifício. Vamos todos morrer e morrer sozinhos. Para que se esforçar seja lá pelo que for? Por que não relaxar e aproveitar quando se sabe que tudo acabará um dia mesmo?

30/08/2017

Se a vida fosse uma sucessão de prazeres, as pessoas não estariam desesperadas para lhe dar um sentido moral e para se anestesiarem com distrações de todo tipo (serviços muito bem prestados pelas religiões). Esse desespero é evidência de que a vida é o oposto de uma sucessão de prazeres, e que para se aderir a ela (ser um agente da autopoiese – simplesmente exercer seus instintos ao mesmo tempo que se tem uma metacognição) é preciso iludir-se. Basta ser uma máquina autopoiética dotada de lucidez para ser iludido.
Igualmente, as teodiceias da autoajuda seriam desnecessárias se o mundo fosse o que elas dizem que ele é: elas são um perpétuo movimento de negação do conhecimento do real em prol da adesão cega a ele, tudo isso disfarçado de “autoconhecimento” e “autoaprimoramento”. Tragicômico.


31/08/2017

Mesmo que fosse possível provar que existem seres inteligentes “do outro lado” (num outro nível do real ao qual não temos acesso) e ainda que esses seres se comunicam conosco (ou seja, eles podem acessar nosso nível do real, mas nós não podemos acessar o nível deles, conhecendo-o apenas pelo que eles nos relatam, ou eventualmente por meio de uma viagem intermediada por eles), ou seja, mesmo que fosse possível provar que essas pessoas que alegam entrar em contato com o além realmente estão entrando em contato com o além, mesmo assim, dizia eu, esses seres simplesmente não seriam dignos de confiança (assim como não o são as pessoas que alegam falar com eles): como é uma relação marcada essencialmente por uma assimetria informacional, não temos como ratificar ou retificar o que eles dizem (não há como validar o que dizem, como verificar o contraditório), e, portanto, se acreditamos neles simplesmente damos carta branca para eles nos manipularem livremente. Mesmo que esses seres existam e queiram falar conosco, eles, por uma questão puramente topológica, merecem nosso desprezo.
A questão não é que seja inútil se envolver com esse tema por ele ser obviamente falso (como pensa o ceticismo "neoateu"/cientificista), mas sim por ele estar obviamente para além de qualquer possibilidade de validação epistemológica (ceticismo, mas no sentido filosófico do termo). 

01/09/2017

Todos os caminhos levam para fora da vida.

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O simples fato de não entrarmos coletivamente em acordo sobre o que somos já é suficiente para mostrar que não somos nada: se fôssemos algo isso ser-nos-ia imediatamente cognoscível, e portanto não haveria desacordo ontológico a respeito dessa questão. Por não sermos nada, cada um consegue inventar e acreditar em qualquer ontologia absurda, e por isso não há possibilidade de acordo.

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“Animais: se você ama uns, porque come outros?”

Esse pessoal não percebe que o amor pelos animais serve tão somente como masturbação de determinadas redes neurais (para assim sublimar instintos)? Ele nada tem a ver com uma deontologia.
Como se adiantasse alguma coisa exigir coerência das pessoas em termos de uma moralidade universal quando elas nem conseguem ser coerentes consigo mesmas... Oh pessoalzinho otimista, hein.

02/09/2017

A propensão à adoração é indicativa de afirmação do querer viver (adesão cega à autopoiese). Se existe ainda ascese verdadeira na Índia (nesse lugar onde o povo adora desesperadamente qualquer coisa), certamente ela é residual (mesmo porque se não o fosse esse país não teria a densidade populacional que tem).
Esse papo de considerar os orientais em geral e os indianos em particular um povo “altamente espiritualizado” é puro marketing para vender gurus. Como as pessoas querem acreditar que existe alguma salvação, e como é evidente que ela não está próxima a elas, o jeito é imaginar que ela está em algum outro lugar (seja distante em termos espaciais e/ou temporais). O culto á Índia que ocorre em certas subculturas no Ocidente é só mais um verbete na enciclopédia das utopias inventadas pela humanidade. 
Se o Oriente em geral e a Índia em particular fossem tão “evoluídos espiritualmente” como esse pessoal gosta de acreditar, eles não estariam integrados nessa maquina omnicida do capitalismo global. Idolatrar a Índia por causa dos Vedas é tão ingênuo quanto idolatrar a França por causa de Lacan, ou idolatrar a Alemanha por causa dos seus muitos filósofos, ou a Romênia por causa de Cioran, etc. O vulgo é o vulgo em qualquer lugar, pouco importando os sábios que conseguiram se criar no meio dele.

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Quanto mais o sistema econômico progride e quanto mais a tecnologia reificante avança, mais a maquina omnicida da autovalorização do capital torna-se autônoma, prescindido assim de seus operadores (os quais acreditam que a máquina trabalha para o bem estar deles...): quanto mais nós, humanos, corremos para sermos produtivos, mais produzimos a nossa própria redundância. Se o improvável ocorrer e tudo “der certo” (se não nos destruirmos antes), chegará o dia em que o sistema estará maduro o suficiente para se livrar de nós de uma vez por todas, e assim iniciar um novo estágio no automatismo da matéria que anima o devir.

03/09/2017

Quando se aprende a olhar por detrás das máscaras de bem resolvimento que as pessoas usam, descobre-se que todos os seres humanos são, sem exceção, essencialmente doentes. 

sábado, 12 de agosto de 2017

XXV

27/07/2017

– Você é relativista?
– Depende do ponto de vista...

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Os verdadeiros pessimistas não falam sobre seu pessimismo. Porque sabem que não adianta...

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É impressionante o contraste entre as buscas megalomaníacas da minha adolescência e a da minha juventude – em que eu me enredava em buscas insanas para ampliar o ter e o ser – com a minha situação atual (estou perto dos 31 anos), na qual boa parte do meu esforço se concentra em simplesmente adiar o inevitável colapso fisiológico do meu organismo, acompanhado de suas respectivas dores físicas (ou seja, meu esforço foca-se em manter o que já tenho e em tentar adiar sua perda).
A simples passagem do tempo nos impõem um processo contínuo de morte. Parece que passou um tempo infinito desde que eu postei o primeiro capítulo do Outsider àbeira do abismo, no entanto não faz nem dez anos ainda. 
O que eu fui já está morto. A morte, decorrente do mero automatismo da matéria no tempo, não nos acomete apenas no fim da vida: ela é onipresente e nos acompanha em cada golfada de ar. Essas conclusões eu já conhecia de ler Schopenhauer, mas agora começo a entendê-las intuitivamente.

28/07/2017

Será que, segundo as doutrinas cristãs, Jesus cagava? E cagava fedido de vez em quando? Se é para Deus vir à Terra viver como humano, isso esteve incluído no pacote, não é?

04/07/2017

O pessoal que fala em “especismo” é tão otimista que eles parecem não notar que é muito mais provável que esse conceito seja usado para legitimar o canibalismo do que para convencer as pessoas a abdicarem do consumo de produtos frutos do sofrimento animal.

05/07/2017

O bom-mocismo do senso comum repete das mais diversas formas a mesma “lição de moral” esquizofrênica que basicamente diz “faça o bem sem querer recompensa e... você receberá uma recompensa!”



06/07/2017

O esforço com que os evangelistas do otimismo buscam espargir positividade ao seu redor é diretamente proporcional ao desespero que sentem e que tentam esconder de si mesmos. Puro mecanismo de defesa do ego.



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Tipo limite.
Já faz um bom tempo que eu consigo colocar habitualmente em prática o que digo em 01/12/2016 (“Quando abandonamos as ideias de teleologia e de progresso histórico, abandonamos também as de ‘certo’ e ‘errado’, ‘pessoas melhores’ e ‘pessoas piores’, ‘pessoas boas’ e ‘pessoas más’, etc. Abandonar essas ideias é como sair da reta dos números reais e ir para o plano dos números complexos, no qual não existe mais uma hierarquia de grandeza – existem apenas diferentes e caóticas formas de se distrair enquanto a morte não chega.”): os meus julgamentos sobre os outros são atualmente horizontais e não verticais: eles indicam o quanto eu estou longe idiossincrasicamente dos outros, mas não implicam em uma hierarquização que me coloca acima ou abaixo deles (como, aliás, faz repetidamente Schopenhauer em seu livro secreto (escrito para si mesmo), publicado no Brasil com o título de A arte de conhecer a si mesmo (eu chamaria de inventar a si mesmo...)).
Imaginando as idiossincrasias dispostas em um plano complexo e as pessoas com idiossincrasias semelhantes agrupadas ao longo do plano, a minha idiossincrasia é uma dos tipos limites, que fica próxima a alguma das bordas do plano e, por isso mesmo, encontra cumplicidades em poucas pessoas, é solitária, estrangeira. Os meus julgamentos apenas apontam essa falta de cumplicidade e de identificação com os outros, mas dispensam uma hierarquia que sirva de defesa diante do desconforto da solidão.  
Essa desnecessidade de ficar atacando mentalmente os outros contribui bastante para a promoção da paz de espírito :D

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Cioran, construtivismo social, sociobilogia, eudemonismo niilista, antropologia filosófica, sexta extinção em massa, transhumanismo, Discordianismo, Gurdjieff, Greene, Icke, CNV, Thelema, antinatalismo, extincionismo, indifferens fati: ideologicamente, a minha mente é uma salada de fringes. Essa foi a consequência de “buscar complexificar minha alteridade”.
Por mais que eu me sinta só com minha alteridade complexifica, quando eu ouço os outros falando baboseiras esotéricas e otimistas eu sinto que meu sacrifício pela verdade valeu a pena.

07/07/2017

O maravilhamento com a natureza e com a ciência que desvenda seus segredos (e o culto aos cientistas disso decorrente) é o sucedâneo na ideologia cientificista (onipresente na divulgação científica) daquilo que o Deus bom é para os monoteísmos: um avatar do instinto de autopreservação, a rasgar-se em elogios à vida.

10/07/2017

A quádrupla raiz do mal:
1. autopoiese (comum a todas as formas de vida) (versão materialista da “vontade” schopenhauriana);
2. heterotrofismo (comuns a todos os animais e hipertrofiado no carnivorismo);
3. exaptação negativa da lucidez (a gênese da condição humana);
4. reificação (derivada também da lucidez, e sem ela não se tem civilizações).

Só a quarta raiz é uma construção social humana (e, portanto, poderia ser desfeita, como sonham os utopistas), as outras três pertencem ao domínio da biologia/corporeidade (a terceira até é em parte cultural, mas sem ela somos animais como quaisquer outros, logo se abdicarmos dela estamos abdicando da condição humana). A vida primitiva não era agradável, e provavelmente por isso as pessoas foram voluntariamente construindo a civilização. Talvez as coisas agora estejam piores (difícil avaliar, eu teria que ler muita antropologia para dar um palpite), mas não teríamos como voltar atrás sem abdicar dos confortos materiais que a civilização propicia (isso ignorando o fato de que a atual civilização já está em uma mórbida relação de simbiose parasítica com a natureza: se a civilização fosse parada de um dia para o outro, teríamos chacoalhões nos sistemas naturais que iriam destruir boa parte da vida humana, talvez toda ela; tem ainda todo lixo radioativo que produzimos e que precisa ser administrado por alguma civilização... ou seja, estamos num trem desgovernado em alta velocidade rumo à catástrofe, e não há como pará-lo antes dele atingir o desastre final).
Utopistas sempre colocam a origem do mal no domínio da história cultural humana, para assim poderem sonhar com a reversão do processo (por exemplo, culpam a invenção dos gêneros, da propriedade privada, da religião, do Estado, etc.). Parecem não notar que o processo não teria sido realizado diuturnamente pelos seres humanos se eles não tivessem um ganho com isso: as pessoas não iriam produzir ao longo de séculos, ou mesmo milênios, condições de vida piores se não ganhassem algo com isso. Chuto que o que ganhavam, e que ainda ganhamos, com isso é o conforto material, o qual não tem como ser produzido sem divisão social do trabalho, e, portanto, sem reificação. Ou seja, se chegamos até aqui, foi perseguindo a satisfação de determinadas necessidades que as condições primitivas de vida eram e são incapazes de satisfazer: a vida anterior à Queda também era ruim, do contrário não teríamos nos aventurado para longe dela.

Eu gostaria de escrever um ensaio desenvolvendo essa ideia da quádrupla raiz do mal, mas nunca terei tempo para priorizar isso (há muito material para ler e para pensar a respeito), dado que escolhi outras prioridades na minha vida em vez das elucubrações intelectuais.

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A CNV (Comunicação não violenta), portanto (continuando aqui o raciocínio do fragmento anterior), ao querer, no limite, restabelecer a mentalidade humana primitiva (anterior à reificação) (como diz Rosenberg, “conectar-nos com a forma natural de pensar”), é incompatível com a qualquer civilização. Alguém que tenta usá-la diuturnamente está produzindo a sua própria desconexão com a civilização em que vive, o que trará a si consequências matérias (a menos que a pessoa seja herdeira, ou vire mendiga, ou eremita, ou resida em uma comunidade alternativa, etc.).
Eudemonisticamente, e é esse meu interesse, a CNV pode ser útil se utilizada instrumentalmente para lidar consigo mesmo, com pessoas com as quais temos relações íntimas e, eventualmente, com pessoas com as quais convivemos (colegas de trabalho, vizinhos, trabalhadores que prestam serviços a nós, etc.). As pessoas que se aproximam da CNV por causa da utopia que ela alimenta (e a maioria o faz), ou as pessoas que se aproximam pensando em melhorar suas vidas mas que se deixam seduzir por essa utopia, estão condenadas a pegar uma ferramenta que poderia melhorar a vida delas e transformá-la numa fonte de sofrimento para si mesmas.

11/07/2017

Sentido físico do universo: aumento da entropia;
Sentido moral do universo: nenhum;
Sentido físico da vida: autopoiese;
Sentido moral da vida: nenhum.

Schopenhauer diz, capítulo VIII, §109, de Parerga e Paralipomena, o seguinte:

"Que o mundo possui apenas uma significação física, e nenhuma moral, constitui o maior, o mais condenável, e o mais fundamental erro, a própria perversidade da mentalidade, e provavelmente forma no fundo aquilo que a fé personificou como o anticristo. Contudo, e a despeito de todas as religiões, que em sua totalidade afirmam o contrário, o que procuram fundamentar à sua maneira mítica, este erro fundamental nunca desaparece inteiramente do mundo, mas, de tempos em tempos, sempre ergue novamente sua cabeça, até que esta é novamente forçada a se encobrir pela indignação geral."

Erro fundamental? Indignação geral? Não percebe Schopenhauer o perigo de recorrer ao arbítrio do vulgo como fiel da balança? Essa verdade fundamental desagrada ao vulgo porque é incompatível com a realização da autopoiese (nas palavras de Schopenhauer, com a afirmação do querer-viver), e, por isso, deve ser negada. Não percebeu Schopenhauer a contradição entre o conhecimento e a vida? Percebeu, mas por que aqui parece não notar isso? Isso que dá levar Platão a sério, com seu blá-blá-blá de identidade entre verdade, bem, virtude, beleza... O fato da massa, formada por meras máquinas autopoiéticas (para usar a linguagem schopenhauriana: pessoas cujo intelecto não está em nada emancipado da vontade), não aguentar essa falta de sentido moral para a vida deveria ser uma evidência de que essa falta é justamente a verdade.
Sem perceber, aqui Schopenhauer se comprometeu com a afirmação da vontade que ele tanto demonizou. Isso que dá ser um idealista.

domingo, 23 de julho de 2017

XXIV

10/07/2017

Que fazer com as evidências anedóticas?
Se fôssemos acreditar simultaneamente em todas as evidências anedóticas que as pessoas relatam e que indicam a existência de “algo a mais” além do mundo reconhecido pelo senso comum e pelas ciências, uma das conclusões que poderíamos tirar (e, se não me engano, foi essa a tese do ótimo Charles Fort) é que vivemos numa espécie de confluência/superposição de diferentes mundos, a qual erroneamente acreditamos ser um mundo só. Outra conclusão, nem não tão distante dessa primeira, é imaginar que estamos num mundo virtual, simulado, no qual são rodadas simultaneamente diferentes simulações cosmológicas.   Também gosto da metanarrativa do David Icke, vejo-a como uma boa atualização pós-moderna da Gnose, uma que consegue englobar essas múltiplas e superpostas simulações em que estamos enredados.
Outra solução, bem mais plausível no meu ver, para esse impasse é não acreditar nesses relatos extraordinários, é ver essas pessoas como charlatães e maquiavélicas, ou como pessoas delirantes sem autocrítica, ou como uma mistura de ambas as condições. Pelo menos da minha parte, eu imagino que, se eu vivenciasse as experiências que essas pessoas alegam vivenciar, eu não acreditaria nas conclusões que elas tiraram do que viveram. As pessoas em geral concluem, seja lá o que for, rápido demais, e as que vivem (nem que só em suas cabeças) os traumas dessa experiências extraordinárias tendem a querer uma conclusão peremptória ainda mais rapidamente. Mas a verdade é tudo menos algo que se alcança facilmente. Cada um de nós está preso na própria cabeça, e a realidade que cada um inventa pode ter pouco ou mesmo nada a ver como o real que estimulou a consciência a produzir essa sua representação em particular. Tudo é possível, pelo menos dentro das cabeças delirantes humanas. É apenas com muito esforço e método que conseguimos prescrutar o real por trás da polifonia das realidades. 
É em virtude de vieses cognitivos que as pessoas decidem dar crédito (ou mesmo que seja só atenção) a determinadas evidências anedóticas em detrimento de outras. O mais razoável e menos viesado seria desprezar todas igualmente. E se isso vale para as evidências anedóticas, vale mais ainda para as meras argumentações, para as elucubrações da “razão pura” (pura de evidência empírica, mas não de desejo).
(continua em 23/07/2017)


14/07/2017

Não sei exatamente quando, mas em algum momento entre seus 15 e 21 anos Lucas Caetano da Rosa, o vulgo “Vagazoide”, já havia perdido a fé na humanidade. Quem me dera eu não tivesse precisado de 13 anos de estudos de Schopenhauer e de Cioran para conseguir eu também essa realização!

15/07/2017

Qualquer narrativa que prometa uma solução para o impasse da existência humana é utópica, fantasiosa, não importa qual seja seu conteúdo específico, qual seja o seu nível de complexidade, ou qual seja seu púbico-alvo.

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Os charlatães de todas as estirpes fazem tanto sucesso simplesmente porque as pessoas querem ser enganadas, precisam mesmo de ilusão para suportar viver e realizar a autopoiese nesse deserto dor real. Olhe a sua volta.

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Que sucesso a pessimista Gnose teria tido se não prometesse a salvação ao menos para uma meia dúzia de eleitos?

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Embora se chame “autoajuda”, depende do intermédio de gurus, de figuras de autoridade.

17/07/2017



“É preciso imaginar Sísifo feliz.” (Camus)

Ou seja, para não se matar é necessário ser masoquista. E eu já cogitei levar a sério esse imbecil. Qual a diferença disso e de acreditarmos que não podemos nos matar pois nossa vida pertence a Deus? Ou, ainda, acreditarmos que devemos nos submeter a um imperativo categórico (racional (Kant) ou irracional (Nietzsche), tanto faz)? A solução de Camus é até pior, pois propõe um masoquismo que se esgota em si mesmo, que sequer se fundamenta  em um alhures. No mais, é tudo devaneio do instinto de conservação, com diferentes graus de erudição e de ingenuidade. É tudo tão medíocre que custa-me crer que se trata de alta literatura, e não de mais um livro qualquer de autoajuda. Eu ganharia mais indo atrás de macho (o que não faço, pois considero uma perda de tempo) do que lendo esses “grandes pensadores”.
O único argumento que eu acho válido contra o suicídio é esperar que a vontade de se matar pode passar. No meu caso, levou 13 anos e uma tentativa de suicídio quase bem sucedida para passar.

18/07/2017

Em virtude dos mecanismos de defesa do ego, as pessoas sempre inventam racionalizações para justificar suas atitudes, de tal forma que, quando precisamos avaliar se vale a pena lidar ou não com alguém (e, se valer, como lidar com a pessoa), devemos avaliar as consequências de suas atitudes, e não as justificativas apresentadas.

21/07/2017

Se eu tivesse que me definir por algum “ismo”, diria que estou em algum lugar entre o eudemonismo e o niilismo: um eudemonismo niilista, ou um niilismo eudemonista, ou algo por aí.

22/07/2017

No começo de suas ruminações sobre a morte, o convalescente Ivan Ilitch fica feliz ao pensar que todos passarão pelo que ele está passando. Mas não é bem assim. Todos morreremos, mas nem todos teremos a sorte de uma morte lenta (que dure meses, como o caso dele) e dolorosa. A maioria das pessoas, covarde como sempre, deseja inclusive uma morte rápida, inconsciente e indolor – seu sonho é morrer dormindo, para que não tenham que enfrentar a morte nem mesmo no momento de sua consumação.

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Ciclo vicioso: Assim como a/o esperança/otimismo alimenta o desejo, as ações práticas realizadas com o fito de conseguir o objeto de desejo implicam, uma vez que possuem custos (tempo, energia, esforço, concentração, custos de oportunidade, etc.), num reforço positivo da/o esperança/otimismo – e assim aumenta o sofrimento. Quanto mais perseguimos prazeres, mais infelizes ficamos.

23/07/2017

(continuação da nota de 10/07/2017)
Comparemos, por exemplo, as experiências de quase morte (EQM) de Andressa Urach e de Eben Alexander III (essa última inclusive foi inspiração para a elaboração do meu Post (mortem) scriptum). 
Embora ambas as experiências tenham uma narrativa semelhante e apontem para a existência de um Deus bom e misericordioso (um anti-demiurgo), enquanto a de Urach ratifica a narrativa padrão da IURD, a de Alexander III basicamente delineia um narrativa tipicamente new age, espiritualista e que pretende-se unificadora de todas as religiões. Enquanto Urach diz que respeita as outras religiões e que está somente relatando a sua experiência, a sua realidade, Alexander III, mais megalomaníaco, alega, e inclusive estrutura a sua narrativa para oferecer evidências anedóticas disso, que a sua EQM foi bem mais profunda do que todas as outras, e que ele teria alcançado o centro do mundo espiritual (enquanto as outras penetraram menos nele).
Ora, se supormos (e não é essa para mim a hipótese mais provável) que essas ambas experiências de fato são mais do que alucinações e que ambas entraram em contanto com domínios do real que estão corriqueiramente inacessíveis aos humanos mas que estão em constante intercâmbio com o “aqui, desse lado”, então teremos que admitir a existência de múltiplos domínios do real, que são ou paralelos e sem hierarquia (horizontais) ou concêntricos e hierarquizados (verticais). Esses múltiplos reais são um fenômeno natural/criação de um Deus bom ou são uma estrutura artificial/ criada pelo demiurgo ou pelos administradores da Matrix (arcontes) na qual estamos presos? 

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Joo-Ho Bong, o diretor do filme Okja, diz que virou vegano – por dois meses – por ocasião das visitas que fizera em matadouros como parte do processo de pré-produção do filme. Alegou ainda, que foi particularmente o cheiro que o abalou (talvez porque as imagens já estão disponíveis há tempos para quem quiser vê-las, né – a novidade é o cheiro). Dois meses depois do trauma, ele voltou a comer carne, não sem algum sentimento de culpa.
Daí já se nota o utopismo e o otimismo ontológico da militância vegana/vegetariana: mesmo não raro desprezando o ser humano, ela geralmente acredita (ou ao menos acreditava há alguns anos, talvez não acredite mais) que, se as pessoas soubessem o que ocorre nos matadouros (se eles não fossem escondidos do escrutínio público), elas deixariam de comer carne. Joo-Ho Bong, mesmo tendo uma experiência completa de imersão e mesmo dirigindo um filme sobre o tema, persistiu na necrofagia.
A impressão que eu tenho é que o roteiro do filme foi escrito antes da palavra do ano de 2016 se tornar “pós-verdade”, pois nele os militantes defensores dos animais acreditam que as pessoas vão parar de comer carne se souberem dos horrores envolvidos em sua produção (crença desmentida posteriormente pela grande empresária, que diz, com razão, que se for barato as pessoas comprarão), sendo que isso sequer ocorreu com o diretor do filme...
Por falar no assunto, achei boba essa escolha de “pós-verdade” como a palavra de 2016, só por causa da traumática vitória de Trump. Mais uma vez, utopismo e otimismo ingênuo: “pós-verdade” (ou “hipocrisia”, para quem dispensa o neologismo redundante) não é a palavra de 2016, mas a da de toda história humana.

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Sobre a irrealidade.

"Sofremos: o mundo exterior começa a existir...; sofremos demasiado: ele desaparece. A dor só o suscita para desmascarar sua irrealidade." (Cioran, em Silogismos da amargura)

Há um tempo que eu venho notando que a sensação de irrealidade – abordada várias vezes no Outsider à beira do abismo – é algo bem mais corriqueira do que eu pensava. Antes, eu achava que era algo que só poucos malucos sentiam (incluso eu, é claro), mas com o tempo fui notando-a repetidamente em toda parte. Muitos filmes abordam o tema sutilmente (por exemplo, no final de “Sobre meninos e lobos”, um filme protagonizados por notórios homens insiders), cheguei a descrever a sensação para uma insider e ela disse que já aconteceu com ela. Acontece com todo mundo, ainda mais em uma época histórica em que estamos afogados em simulacros – e estaremos cada vez mais. Ela está mesmo na origem do pensamento religioso (e portanto do utopismo também).
Será a sensação de irrealidade mero mecanismo de defesa do ego – diante da dor, uma forma de lidar com ela é negando-a, achando-a irreal? Ou serão esses momentos de estupor os nossos momentos mais lúcidos?

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Zilhões de googolplex.

“Às vezes conseguimos nos esquecer em alguma coisa; mas como nos esquecermos no próprio mundo? Esta impossibilidade é a definição da dor. Aquele que é atingido por ela não se curará nunca, mesmo que o universo mudasse completamente. Só seu coração deveria mudar, mas é imutável; também para ele, existir só tem um sentido: mergulhar no sofrimento – até que o exercício de uma cotidiana nirvanização eleve-o à percepção da irrealidade...” (Cioran, em Breviário de composição)

Nessa terça-feira (18/07) lá fui eu fazer os exames solicitados pelo médico em 03/07 (conforme mencionado aqui antes). Tinha que ficar em jejum, acordar cedo (sendo que eu demorei para pegar no sono), e também me enfiaram um “acesso” para injetar contrastes em mim (para ressonância magnética e para tomografia computadorizada). Ainda por cima, eu estava com laringite (tive inclusive que ir no hospital da quinta-feira para me receitarem antibióticos). Inverno... Tudo uma merda.
Enfim, todo esse contexto de sofrimento e de privação me permitiu ter uma experiência quase mística.
Um dos contrastes injetados foi iodo, e ele deu uma espécie de “barato” (deu para senti-lo chegar à aorta e se espalhar pelo corpo). Se iodo dá isso, imagine-se heroína. É compreensível que esses rockstars se matem – provavelmente nada nesse mundo pode ser o bastante para quem conheceu as delícias da heroína (mal o é para mim, que nem a usei).
Enquanto eu esperava numa maca para o segundo exame (no qual injetaram outro contraste, mas que não deu barato), fiquei deitado por um tempo que pareceu interminável. Todo aquele artificialismo – máquinas caras, telas de LCD, técnicos uniformizados, pinturas abstratas na parede – fez-me teletransportar para as savanas. Senti-se na pele dos primeiros hominídeos. Como chegamos a esse ponto de traição de nossa própria natureza animal? A Queda... O ápice da humanidade foi na pré-história...


No segundo exame, enquanto a máquina ficou por 20 minutos apitando diferentes barulhos na minha cabeça (tudo isso para fazer uma mera ressonância magnética do ombro), eu viajei pelo omniverso (não é a primeira vez que isso aconteceu, a primeira rendeu certos manuscritos que eu nunca tive tempo de transcrever, quem sabe um dia eu os transcreva aqui), vi zilhões de googolplex de universos coexistindo simultaneamente. Havia um universo diferente para cada estado quântico de cada partícula desse nosso universo. Todas as possibilidades aconteciam ao mesmo tempo. Bilhões de Duans Conrados Castros, um infinitesinalmente diferente dos outros – mas, como são tantos, havia uns totalmente diferentes do que eu sou, uns correspondiam aos meus ideais, outros eram ainda piores do que eu sou (segundo os mesmos critérios).
Enquanto voltava para casa eu pensava: adiantaria alguma coisa, em termos de aplacar o meu sofrimento, saber que existem milhares de versões mais bem-sucedidas de mim, mas que também existem milhares de versões menos bem-sucedidas, fora as trilhões de Terras onde eu nunca cheguei a existir? Concluí que é uma pergunta utópica, mera tentativa dos meus instintos de autopreservação de tornar o meu sofrimento relativo: se eu estou preso nesse corpo e nesse universo, pouco importa se existem outros ou não. Toda minha existência se esgota aqui. É contraproducente tentar fugir do sofrimento com esses delírios utópicos.

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A via da perdição.

"O problema do mal só perturba realmente alguns delicados, alguns céticos, revoltados pela própria maneira como o crente se conforma com ele ou como o escamoteia. É para esses então que, em primeiro lugar, se dirigem as teodiceias, tentativas de humanizar Deus, acrobacias desesperadas que fracassam e se comprometem no seu próprio terreno, desmentidas a cada instante pela experiência. Embora procurem convencê-los de que a Providência é justa, não o conseguem." (Cioran, em Ensaio sobre o pensamento reacionário)

Ainda em 18/07, enquanto eu estava na maca no ínterim entre os dois exames, uma enfermeira veio falar comigo. Perguntou sobre a lesão muscular fruto de uma tentativa de suicídio há quase 6 anos atrás. Aí ela me tratou como me trataram as pessoas na época em que tentei me matar: de forma maternal.
Perguntou por que eu tentara me matar, se fora por amor. Eu disse que nunca me senti partícipe desse mundo... Ela disse que ela também não se sente (olha aí a sensação de irrealidade onipresente), fez breves considerações sobre a burocracia e a reificação (sem usar essas palavras, claro).
Aí então perguntou se eu costumava ler, já imaginei onde ela queria chegar. Eu disse que já li mais no passado, mas que não me interessava muito no momento por leituras. Perguntou se eu já tinha lido a Bíblia (sim, foi aí que eu imaginei que ela iria chegar), eu disse que já, ela ficou surpresa (oh pessoalzinho previsível, hein) e disse que a Bíblia é um livro "profundo" (rs). Nem lembro como a conversa acabou, mas não cortei o assunto, nem fui grosseiro, nem fiz promessa nenhuma – dessa vez, diferentemente do que ocorrera em 03/07, eu me lembrei de vestir a máscara social. Simplesmente ficou por isso mesmo. E então ela voltou ao trabalho dela – afinal, estava ali para trabalhar né, não para se compadecer dos outros e evangelizá-los. Todos querem distribuir receitas de felicidade... Senti-me em The Sims – dentro do jogo, falando com um Sims, rodeado de simulações de seres humanos. Novamente, irrealidade.
No primeiro filme da trilogia Matrix, certa hora, isso no começo (antes de Neo tomar a pílula vermelha), Morpheus fala para ele algo assim (estou citando de cabeça, não vou me dar ao trabalho de achar a citação exata): “eu sei por que você está aqui, Neo, você está aqui porque sabe que existe algo de errado com esse mundo, e quer saber o que é.” No caso, o “saber o que é” passava por tomar a pílula vermelha. Ora, todas as pessoas sabem que algo vai muito mal nesse mundo (tanto que se identificam com o filme), e uma das funções da ideologia é dar uma explicação/justificação para a presença do mal no mundo. Mas quantas pessoas se afundam na busca desse porquê ao ponto de destruírem a si próprias? Quantas vão tão longe nessa busca ao ponto de não chegarem a lugar algum, exceto os próprios paradoxos? Quantas estão dispostas a pagar o preço de se tomar a pílula vermelha? O preço de ir tão longe que todo o senso comum (incluído aí a “profundidade da Bíblia”), e com ele a própria vida, se esfumaça diante de seus olhos? Esses, que apenas chegam a essas revelações consentindo com a própria destruição, são os verdadeiros outsiders, e, como tal, não servem mais à autopoiese da espécie.
Todo insider é um potencial outsider – o que lhe falta para sê-lo é deixar-se levar por essa via de perdição. Mas não se deixa, pois seus instintos de autopreservação são fortes demais em comparação com o desejo de entender: instintivamente notam o perigo da busca pela verdade, e se afastam rumo ao conforto e a segurança da ignorância.


sábado, 8 de julho de 2017

XXIII

18/06/2017


Perdidos em suas utopias, às vezes é preciso relembrar ao pessoal de humanas o óbvio: um sistema sígnico não gera pulsões, o máximo que ele pode fazer é tentar canalizá-las; elas têm sua origem não no domínio da cultura, mas no domínio dos instintos corporais. Pretender reduzir as questões de gênero e de sexualidade à cultura é tão reificante quanto pretender reduzi-las à biologia.

03/07/2017

Hoje de manhã, fui num médico no qual eu nunca tinha ido. Como eu tinha acabado de acordar e era segunda-feira, esqueci de colocar a minha “máscara social”. Basicamente tratei ele sem aquela circunspeção/submissão que o bom-senso recomenda ao se lidar com “autoridades” em geral, e ainda mais num primeiro encontro com elas. Resultado: o sujeito achou que eu estava drogado e ainda recomendou que eu fosse em um psicólogo (sendo que eu já recebi alta de duas psicólogas diferentes, rsss), e ainda deu a entender que em consultas futuras (terei que voltar lá para levar resultados de exames) vai insistir para que eu vá em algum psiquiatra... A mentira é a base da sociabilidade e das “boas maneiras”.

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Não há como comprometer-se simultaneamente com a verdade e com a vida. Quem escolhe comprometer-se com a vida escolhe, também, iludir-se. Qualquer discurso comprometido em defender a vida tal como é, ou que a critica para propor-lhe melhorias, está inevitavelmente eivado de ilusões.

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Quanto mais se deseja, mas se sofre. E quanto mais se sofre, mais se busca inventar sentidos morais para justificar o sofrimento – e é aí que entra o pensamento religioso. Quanto menos desejamos, menos precisamos da religião (ou da utopia política) como muleta existencial. Nada é mais depressor do que o otimismo, pois ele alimenta a esperança, e essa alimenta o desejo e a sua consequente frustração, aumentando assim o sofrimento.

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Não é o fato do mundo ser uma merda que nos faz sofrer, mas sim é a nossa permanente recusa em nos resignarmos ao que o mundo é. Quanto mais temos esperança de que as coisas vão mudar, mais quebramos a cara e sofremos.

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Antes mesmo de uma religião se tornar a principal religião de um povo, ela já destruiu todo o espírito da doutrina original que a inspirou, já o aniquilou para tentar agradar à massa ignara, já escolheu servir a Mamon, em detrimento da causa que iniciou o movimento. Dalai Lama não tem mais ligação alguma com o que o budismo foi em seu início.


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Que diferença há entre um monge de verdade (se que é ainda existe algum) e um atleta olímpico? O monge acha que está transcendendo esse mundo e, em vez de ser sustentado por grandes corporações, é sustentado por outras pessoas que também acreditam nessa possibilidade de transcendência e que veem no monge uma prova da veracidade dessa possibilidade. Fora isso, ambos são tarados, viciados até o masoquismo.

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Cedo ou tarde, todos precisam encarar as próprias limitações.

06/07/2017 

Boa parte das pessoas obcecadas em ganhar dinheiro e em ter sucesso profissional ignora os custos de oportunidades dessas suas taras, embora costumem calcular os custos de oportunidade de quase tudo. Sem essa cegueira, sua eficácia iria ralo abaixo.

07/07/2017

Assim como eu não sou mais a pessoa que tentou se matar em 2011, não sou também a pessoa que se encheu de tatuagens em 2013 e 2014. A ideia da permanência de uma identidade que progride no tempo é uma ilusão cultural e dependente de memórias viesadas. O próprio “eu” no aqui e no agora não passa de uma reificação útil à autopoiese, de uma máscara para uma miríade de redes neurais em interações cibernéticas, não raro conflitantes (daí as contradições que todos apresentamos).

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processo de autoconversão e o sofrimento político.
Quando uma pessoa descobre-se posicionada fora do senso comum – descobre-se, por exemplo, incapaz de acreditar em Deus, ou com desejos homossexuais, ou com um desejo de não ter filhos, ou com um desejo de não comer carne por amor aos animais, ou com uma aversão à violência intrínseca à semiótica da masculinidade, etc. –, ela precisa refazer seu mapeamento cognitivo, pois o mesmo, construído cumulativamente em interação com o senso comum, está eivado de crenças que ferem esse posicionamento recém-descoberto e com o qual a pessoa decidiu comprometer-se.
É esse processo de reforma do mapeamento cognitivo que eu estou chamando aqui de “autoconversão”, e ele pode levar meses, ou mesmo anos, para estar concluído (a se depender a sagacidade de pessoa, do tempo e da energia que ela dedica à reforma, etc.). Enquanto esse processo não estiver concluído, repetidamente a pessoa se vê na obrigação de ficar reafirmando para si própria a sua posição toda vez que ela se depara com alguém que não a adota – e como a posição em questão fere o senso comum, isso ocorre o tempo todo. A pessoa, então, fica em um estado quase permanente de tensão, pronta o tempo todo para se defender dos ataques vindos do mundo exterior – não raro, os ataques sequer são, stricto sensu, dirigidos à pessoa: ela se defende da simples existência, no senso comum, de uma ideologia de legitimação do posicionamento que ela não adota, ao qual ela recentemente descobriu-se opositora.
É nesse processo defensivo – parte integrante do processo de autoconversão – que a pessoa frequentemente cai na armadilha de transformar sua posição em uma ideologia política: quer converter o mundo ao ateísmo (“à razão”), quer acabar com qualquer sinal de aversão a homossexuais (ou mesmo com "todas as formas de preconceito”, rs), quer que todos deixem de procriar, não descansará enquanto um único animal ainda estiver sofrendo para o prazer humano ou enquanto uma única mulher ainda estiver sofrendo para o prazer masculino, etc. Embora essa politização possa ser útil como parte do processo de autoconversão, não raro ela se transforma, do ponto de vista da economia do sofrimento, em uma armadilha: a pessoa pode acabar se habituando ao proselitismo e, mesmo quando já concluiu a autoconversão, continuar por isso a se torturar pelo fato de o mundo não se curvar ao seu novo deus, ao seu projeto de salvação. Por exemplo, conheço gente que está há quase 50 anos sofrendo porque o mundo permanece a comer carne.
Para aqueles que, como eu, priorizam a diminuição do sofrimento pessoal, é preciso muita cautela com essa politização – embora ela possa ser útil como parte do processo de autoconversão, ela pode facilmente tornar-se uma armadilha, ser reprodutora de sofrimento pessoal. Ora, não se decidiu comprometer-se com esse posicionamento outsider justamente para diminuir o sofrimento, já que é sofrido violentar a si mesmo ao ir contra sua própria natureza para agradar aos outros? É comum que essa politização seja abandonada quando a pessoa atinge a autoconversão: cansada de “dar murro em ponta de faca” e já estando o mapeamento cognitivo devidamente reformado, a pessoa resigna-se ao fato de o mundo não pensar como ela pensa. Não sofre mais por ver-se repetidamente em oposição ao mundo. Tal como um cu já acomodado ao caralho que o fode, torna-se insensível ao não lhe oferecer mais resistência. Mas em outros casos, a pessoa, masoquista, decide-se por passar o resto da vida a sofrer por uma causa perdida.
Não é só o masoquismo que mantém esse proselitismo vão, é, também, o prazer decorrente de imaginar-se melhor que os outros – prazer que, ao reconfortar o ego, serve-lhe de mecanismo de proteção. Crendo-se “parte da solução e não do problema” (o que já pressupõe a crença utópica de que existe uma solução para o impasse humano), a pessoa não precisa mais de autocrítica, não precisa mais aprimorar-se (exceto quando o aprimoramento é entendido como um afundar-se ainda mais na dita ideologia política): é um mocinho rodeado de vilões, é um agente do bem rodeado pelo mal. Em uma palavra, é superior. Embora sofra por estar em guerra permanente com o mundo, goza por acreditar ser-lhe superior, e recorre inclusive a essa ilusão de superioridade como estratégia para esconder de si mesma o reconhecimento de outros problemas que possui (até porque, se os reconhecesse, teria que vilanizar a si própria, e acreditar-se digna de castigo, dado que é isso que pensa dos outros). Nesse ponto, a posição de diferente torna-se fonte de desperdício conspícuo, e a pessoa torna-se sadomasoquista.
Quanto mais traumático o processo de conversão (trauma inclusive diretamente proporcional à resistência apresentada pelo círculo de relações da pessoa ao posicionamento por ela adotado), maior a probabilidade da pessoa transformar-se em proselitista de uma ideologia-utopia política.
Já eudemonistas, como eu, simplesmente não sofrem por ideais políticos.

sexta-feira, 16 de junho de 2017

XXII


11/09/2016 (encontrado e revisado em 17/06/2017)


Sobre a vida e a morte.



Somos máquinas autopoiéticas fruto de um processo de seleção natural de 4 bilhões de anos. Nossas individualidades e alteridades são construídas em processos multidirecionais e cumulativos nos quais há interação de fatores biológicos, psicológicos e culturais (nosso material genético, a nutrição de nossas mães durante a gravidez, a nossa nutrição desde a primeira infância, a relação com nossos pais (a qual por sua vez inclui a psicologia dos nossos pais com seus vícios e virtudes), a cultura da sociedade em que vivemos e crescemos, os resultados cumulativos das decisões que tomamos e das decisões que outros tomam e nos afetam, etc.). Essas individualidades e alteridades podem ser suficientemente explicadas pelas ciências biológicas e sociais, de tal forma que é desnecessário recorrer ao conceito de “alma” para explicá-las (no passado da humanidade – antes de século XX – realmente não tínhamos conhecimento científico suficiente sobre a natureza e sobre nós mesmos para entendermos esses processos, de tal forma que o conceito de alma de fato soava como uma boa explicação).

Portanto, ao morrermos, essa nossa identidade e essa nossa alteridade – enquanto construções bio-psico-sociais – desaparecem com o fim da atividade autopoiética do nosso corpo e de nosso cérebro. A informação é destruída com a metamorfose de sua base material – da mesma forma que o conteúdo de um texto escrito com tinta em um papel se perde se o papel é queimado, ou rasgado, ou molhado, ou comido por traças, etc.

No domínio da natureza, a morte em geral é decorrente da “guerra eterna” na qual os seres se entredevoram na competição por matéria e energia para realizarem a sua própria autopoiese. No passado (antes da invenção dos antibióticos), seres humanos podiam morrer em função de um único ferimento: já era suficiente para  sofrerem uma infecção (ou seja, para seus corpos serem atacados por bactérias que os usam para fazerem a sua própria autopoiese). A morte por velhice – tanto de animais quanto de humanos – é algo que só vemos na sociedade humana, a qual, mediante divisão social do trabalho e emprego de tecnologias, consegue produzir uma quantidade tal de valores de uso (os “bens”) que permite sustentar com conforto os seres mais fracos (incluindo os que estão envelhecendo), e assim a luta permanente pela autopoiese é suavizada. É nesse ambiente mais confortável que o envelhecimento surge como fenômeno estatisticamente relevante. Na natureza, basta o indivíduo perder o viço da mocidade para ser devorado vivo por seus predadores.

O motivo pelo qual envelhecemos está sendo investigado pela ciência, a explicação que é considerada mais razoável pelos cientistas é a de que existem mecanismo internos à célula (em particular o encurtamento dos telômeros) que buscam restringir seu processo de autopoiese para diminuir a possibilidade desse processo sair do controle – quando uma célula passa a se reproduzir descontroladamente isso é conhecido como “câncer”. Desse ponto de vista, a morte por envelhecimento seria um subproduto dos mecanismos celulares que diminuem a probabilidade de cânceres aparecerem. Isso faz bastante sentido quando notamos que a autopoiese é o em-si de toda a cibernética molecular conhecida como “vida”.

O envelhecimento – e, numa perspectiva mais ampla, a degradação de qualquer coisa no tempo – é consequência, em última instância, do atrito (sem o qual obviamente a própria vida é impossível).

Nossos cérebros têm toda uma cibernética de produção do nosso ego, de nosso self, de nossa alteridade, de nossa identidade (estudados pelas neurociências e pela psicologia). Usualmente nós entendemos, interpretamos, como sendo o “eu” justamente aquilo que nos diferencia de nossos semelhantes (a nossa alteridade). Se isso for o “eu”, então claramente a morte é a sua extinção, assim como a vida é seu processo de construção (em especial na infância e na adolescência) e autopoiese, em luta permanente contra a morte, a qual por fim sempre vence. Porém, se considerarmos que essa noção de eu (ego) é estrutural da consciência como produzida pelo cérebro, esse “eu” é o mesmo em todos os cérebros (é idêntico em todos os seres animais, que são os dotados de consciência). Com o aumento da consciência (produzida pelo cérebro e aumentada em proporção ao aumento do cérebro e com a cumulatividade cultural) atinge-se a consciência da consciência – a lucidez (característica, junto com o polegar opositor, que distingue os humanos dos demais animais). De forma geral, esse “eu” autoconsciente é o mesmo em todos os seres humanos, e os processos envolvendo esse eu (processos “subjetivos”, que ocorrem em nossas cabeças, em nossos cérebros) constituem parte daquilo que chamamos de “humanidade compartilhada” (a “condição humana”, a “natureza humana”).

Enquanto estrutural da espécie, esse “eu” autoconsciente sobrevive à morte de cada um dos humanos, assim como já existia antes de cada um deles existir. Ele desaparece com a espécie em um sentido estrito (enquanto eu autoconsciente) e com a extinção da animalidade em um sentido amplo (enquanto eu consciente).

Assim como a vida surgiu e evoluiu na Terra ao longo de bilhões de anos, é bem possível que esse fenômeno tenha ocorrido e venha a ocorrer outras vezes em outros planetas que tenham condições análogas à da Terra. Por mais que seja improvável que essas condições ocorram todas juntas (ao menos as necessárias para desenvolver vida multicelular e animais vertebrados), o universo é tão grande que é bem provável que essas condições se repitam e a vida eventualmente imerja da esterilidade cósmica, sendo a matéria novamente lançada no pesadelo da insônia.

Como ocorreu essa emergência da primeira molécula autorreplicante ainda não está clara para a ciência. Os cientistas tendem a considerar ela como um evento aleatório. Simulações em laboratório da “sopa primordial” indicam que sob certas condições essas moléculas orgânicas que se replicam, se auto-põem, passam a surgir. Eu prefiro ver essa emergência como uma consequência natural de um universo “biocêntrico” no qual o em-si, o Atman, é uma “vontade de vida”, um “querer-viver”, o qual já é o em-si das próprias forças físicas e que, ao atingir, em nós humanos, a autoconsciência se autodenomina “vontade”. Nesse sentido, essa “vontade” pode ser vista como o centro, o em-si, do nosso “eu”, e cada um de nós como um fragmento autoconsciente e particular desse em-si do próprio universo. Mas, de repente, foi um evento aleatório mesmo... 

XXI


05/06/2017

Há mais verdade ontológica sobre a natureza humana nesse videoclipe do que na maioria dos livros filosóficos:




06/06/2017

Quando eu era adolescente, várias vezes adultos me falaram que eu levava as coisas a sério demais. Se tivessem a oportunidade de conhecer as minhas opiniões atuais (com sua indiferença que beira à psicopatia e com seu niilismo festivo), provavelmente me acusariam de levar as coisas a sério “demenos”. Decidam-se de uma vez se tenho que rir ou chorar diante dessa bosta de mundo! Na verdade, eles, sendo insiders, são cegos ao caráter “bóstico” do mundo, e é isso que os faz incapazes de uma intensidade de sentimento a respeito dessa questão; chafurdam na mediocridade necessária à manutenção inercial dos algoritmos autopoiéticos, e não conseguem entender alguém cujo conhecimento do real levou a um rompimento com esses algoritmos.



10/06/2017

Mesmo num círculo bem restrito, como o dos cientistas ateus, há especulações sobre o futuro totalmente díspares: gente que diz que a humanidade estará extinta em 2030, e gente que se pergunta se nossos descendentes pós-humanos sobreviverão ao fim desse universo (que só vai ocorrer em bilhões de anos). Se, por um lado, esse tipo de diversidade, mesmo restrita a um domínio especulativo ateu e materialista (que ignora a existência de um mundo espiritual que afete esse aqui e lhe dê um sentido moral), ratifica o caráter ficcional das realidades que criamos em nossas cabeças, por outro é essa dúvida a respeito do que vai acontecer com nossa espécie que ainda me mantém disposto a viver. Se eu já tivesse certeza sobre o que vai acontecer, não teria mais nada a fazer nesse mundo. Diferentemente de Cioran, eu não caí do tempo.



11/06/2017

Certa vez alguém me falou, ao comentar sobre uma outra pessoa, “elx é uma pessoa cheia de problemas psicológicos”. Ainda estou para conhecer alguém que não possa ser resumido por essa descrição. 



17/06/2017

Eu sou todas as criaturas e inexistem seres exteriores a mim.



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Difícil achar atividade mais modorrenta do que observar os outros falarem sobre a "realidade", como se soubessem de fato algo a respeito do assunto...