"Mas escrever é expulsar de si tudo o que havia de importante. Portanto, quem escreve é alguém que se esvazia." (Cioran)
"Se você não escrever diariamente, os venenos se acumularão e você começará a morrer, ou a enlouquecer, ou ambos." ("O Zen e a Arte da Escrita - Ray Bradbury)
*
Um cético não toma a decisão de se matar (fora em caso de eutanásia em face a severas limitações corporais), pois uma decisão como essa é embasada na crença de se possuir um conhecimento suficiente sobre o que é a vida e o que é a morte – crença essa que o cético não possui. Como diria Cioran, "o suicídio é um ato de fé".
28/06/2016
Eu: uma vítima da
ideia de "sentido" (enquanto síntese das ideias de “verdade” e de
“salvação”).
29/06/2016
Proposição: nem
amor fati nem odium fati: mas indifferens fati, “apafatismo”.
"Quando
conhecemos o equilíbrio, não nos apaixonamos por nada, não nos apegamos nem à
vida, porque somos a vida" (Cioran, em História e utopia).
09/07/2016
Trade-off da
alteridade
Ao buscar aprofundar-se
em sua alteridade (e na sua respectiva ideologia), se você apresentar suas
visões de mundo para as pessoas elas reagirão com alguma agressividade (em
especial se você mesmo já apresentar a sua visão de forma agressiva), pois o
que está em jogo é a estabilidade dos mapeamentos cognitivos delas (e do seu)
e, portanto, o conforto egoico de todos os envolvidos. Se você não buscar
apresentar a sua visão a elas (apresentação essa que no fim sempre remete a uma
tentativa de educá-las a sua imagem e semelhança, de reproduzir a sua visão nos
outros, colonizando-os e tornando-os mais parecidos com o você é ou gostaria de
ser, e assim reafirmar para você mesmo a correção dos seus valores e opiniões),
elas só vão ser indiferentes a esse "cara estranho". Em ambos os
casos você termina sozinho. É claro que, no fundo, estamos sempre sozinhos,
mesmo que rodeados de gente superficial e simpática: o que muda é a intensidade
dessa solidão e da percepção do abismo que há entre todas as pessoas-ilhas. É
um trade-off: não há como ser "o diferentão" e ainda se sentir bem em
meio às "pessoas comuns" (sendo bem recebido por elas ao exibir sua
alteridade), em especial quando se adota um discurso de vilanização dos outros
como explicação para a gênese das dores do mundo: por que os outros seriam
receptivos a isso, à acusação de que eles são o problema e precisam mudar em
direção ao que você já é ou quer ser para aí o mundo ser um lugar melhor? Não
há como ter as duas coisas: ou se decide aprofundar-se em sua alteridade ao
custo de aumentar a solidão, ou se goza da companhia dos outros ao custo de não
aumentar a diferenciação de sua personalidade em relação a deles. A escolha é
sua.
*
Trade-off da
(in)tolerância
Por que alguém se
dedicaria diuturnamente, de corpo e alma, a uma ideologia/religião/causa se não
acreditasse que ela está atrelada à verdade absoluta? Por outro lado, a simples
existência do diferente já é ofensiva para quem acredita ter as chaves para a
verdade absoluta, para a salvação e para o bem-viver – pois instaura uma
dissonância cognitiva que indica que esses valores aos quais se dedica tanto
esforço talvez não sejam tão absolutos assim (e de fato não são), afinal outras
pessoas parecem viver tão bem, senão melhor, sem eles ou mesmo acreditando em
valores opostos. Mas acreditar no relativismo cultural, aceitar que a crença do
outro é tão legítima quanto a minha, destrói o fanatismo que é a base da minha
dedicação: sem o fanatismo, não há obsessão e portanto não há porque se dedicar
a causa alguma.
A existência de uma
hierarquia de autoridades ligadas à autopoise de qualquer discurso é a
evidência de que ainda existe uma massa de pessoas que toma esse discurso como
uma verdade absoluta e que, por isso mesmo, está disposta a dedicar os seus
recursos escassos (tempo, energia, dinheiro, saúde) à causa. Não que a culpa
seja dos líderes: idólatras por instinto, as pessoas estão à procura de
verdades absolutas, de mapeamentos cognitivos que lhes garanta sem dúvidas o
que o mundo é, para onde ele vai e o que elas devem fazer para se darem bem: os
líderes só oferecem o que a massa neurótica quer: certezas.
Se o relativismo
cultural e o Estado Laico, que garantem a liberdade de fé e pensamento, fossem
de fato aceitos pelos proselitistas, suas fés desmoronariam: sendo equivalentes
e intercambiáveis, sendo ficções úteis, por que se dedicar a elas? Como
escolher a melhor? Como viver com da dúvida? O resultado disso é uma situação
esquizofrênica, na qual o proselitista alega, para ser politicamente correto,
respeitar a opinião dos outros, mas na verdade acha que só ele tem razão e que
todos os outros estão errados, inventando argumentos intermináveis para
criticar e vilanizar os seus oponentes (todos aqueles que não dispõe de sua
fé).
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