sábado, 6 de maio de 2017

IX

05/11/2016

Qualquer metáfora parece uma boa explicação quando ignoramos a complexidade da realidade.

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São explicações tão simples que são simplórias, caricaturas burlescas.
Ser simples é descartar premissas desnecessárias e focar apenas nas informações relevantes não importando se isso vai complicar a sua análise. A preocupação em ser simples não é em descomplicar e sim não inventar explicações precipitadas. Agora, descartar a complexidade em nome da simplicidade é ser simplório. Uma explicação simplória é feita para ser fácil de entender – por isso é tão sedutora para as massas, que querem acreditar que estão bem informadas sobre tudo. 


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Só se importar com o que te afeta diretamente. Porque indiretamente TUDO te afeta, e não dá para estar bem informado sobre tudo.

13/11/2016

O que todas as experiências de grande sofrimento tem em comum é o rompimento do compromisso da pessoa com este mundo. O que muda é a maneira como esse rompimento é pensado e expressado. Quando religiosos dizem que o sofrimento aproxima de Deus, esse Deus é entendido como algo que não é este mundo, que é totalmente diferente dele e como representante de outro domínio da realidade, um oposto a esse. Lutar por alguma utopia política, ou mesmo por utopias pessoais (como ter muito poder, ficar muito rico, encontrar o amor romântico idealizado, realizar-se mediante filhos, etc.): são diferentes utopias, objetos a, ilusões inventadas para dar um sentido ao sofrimento e assim tornar a vida suportável. Em um surpreendente paradoxo, é o desprezo pelo mundo tal qual ele é que permite sobreviver-se nele, desde que se sonhe com um outro mundo e use-se esse sonho como motivador, como a cenoura que o cavalo persegue e nunca alcança. Quanto mais a pessoa mostra-se refém de alguma utopia (não importa se seja transcendental, terrena, política ou individual), mais podemos inferir que ela precisa desse artifício para suportar a vida, logo mais ela provavelmente sofre (na proporção da sua capacidade subjetiva de sofrer e de resistir ao sofrimento).
O problema é que essa estratégia de agarrar-se a uma utopia também gera sofrimento toda vez que as evidências indicam que ela nunca chegará. Uma solução mais eficaz é resignar-se com as limitações do mundo tal qual ele é, e aceitá-lo tal qual ele é, sem ficar comparando ele com formas idealizadas que dizem como ele deveria ser. Isso pode parecer amor fati, mas pelo menos na minha interpretação dos fatos eu chamo de indifferens fati. No indifferens fati o indivíduo mantém apenas um compromisso com sua própria autopoiese (e nem é um compromisso absoluto, ele mantém-se enquanto o viver está relativamente confortável), mas abandona a autopoiese da sociedade e da espécie (o que significa não nutrir nenhum ideal político e não adotar nenhuma soteriologia; e significa, principalmente, não se desgastar tendo filhos (a menos que se seja muito rico e isso não represente muito esforço, ou se utilize dos filhos para enriquecer, etc.)). Enquanto, na minha concepção, o amor fati implicaria em um imperativo categórico de procriar, no indifferens fati só se suja com esse compromisso caso ele seja muito vantajoso do ponto de vista utilitário individual (o que quase nunca o é).

16/11/2016

Existem pelo menos dois fronts atuais no conflito “materialismo x idealismo” (“cientificismo x espiritualismo”, “ateísmo x teísmo”, etc.) nos quais a questão ainda não se resolveu (e, portanto, se alguém espiritualista resguarda sua crença nesses fronts, essa pessoa não pode ser desmascarada pela ciência): a natureza da consciência (se ela é produzida pelo cérebro ou não) e os limites do universo (se existe um multiverso ou não). Se a for demonstrado que a consciência é um epifenômeno da matéria e se for demonstrado que estamos em um multiverso caótico (destruindo assim o argumento teísta da ordem, da simetria, da beleza), então o espiritualismo teria que confessar que acredita porque é absurdo, já que não teria mais argumentos.

Sobre a palhaçada do “livre-arbítrio”: a neurociência já demonstrou que é o inconsciente que decide e joga a decisão para o consciente, o qual só inventa uma justificativa para si mesmo (e para outras consciências). Os que acreditam em livre-arbítrio ainda podem alegar –e para isso podem se basear em Schopenhauer, Kant e provavelmente muitos outros – que a liberdade está no inconsciente. Porém, se estudarmos a biologia evolutiva do inconsciente, não é difícil vê-lo como um subproduto do automatismo animal. Porém, até que de fato a ciência tivesse destrinchado os algoritmos do inconsciente humano, o fantasma do livre-arbítrio ainda pode escapar do escrutínio científico e apresentar-se com não refutado pela ciência.

Claro, aquilo que pode ser aceito sem evidências, pode igualmente ser descartado sem.

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