20/09/2016
Boa parte do que
chamamos de “cultura” – e toda a indústria do entretenimento – basicamente
envolvem uma masturbação sem fim do instinto sexual, dos instintos de
luta-e-fuga, e de demais algoritmos de nossa animalidade (todos ligados à
autopoiese). São uma forma de sublimarmos a energia (no sentido físico da palavra: capacidade de realizar trabalho) que “sobra” em relação à
autopoiese da vida mais imediata – essa energia precisa ser sublimada para
manter a saúde dos indivíduos e a estabilidade das instituições sociais (e dos
poderes estabelecidos – e aí que a cultura, em especial a religião e a
indústria do entretenimento, engloba as técnicas de administração das massas).
Essa energia “sobra” justamente porque com o desenvolvimento da divisão social
do trabalho e da tecnologia a produção da autopoiese da vida mais imediata é
facilitada: assim, quanto mais desenvolvida uma sociedade, mais energia sobra
para ser sublimada no domínio da cultura. Como essa pulsão por definição não
possui uma destinação biológica (correspondente a alguma função biológica, para
além da autopoiese), qualquer destinação para ela será por definição fictícia:
enchendo assim o domínio da cultura de um acervo inesgotável de delírios. É
essa ausência de destinação natural para essa energia que é sentido subjetivamente
pelos indivíduos como VAZIO.
Na religião, os
mundos escapistas imaginados são apresentados como o “mundo real”, do qual esse
aqui é uma sombra; na indústria do entretenimento não se tem essa pretensão:
ela está explicitamente comprometida com o irreal. Por caminhos em parte
opostos, ambas buscam fugir da opressiva banalidade do verdadeiro. A se
depender dos avanços tecnológicos, os delírios da indústria do entretenimento
estão apenas começando.
21/09/2016
Aporias do animal paradoxal:
Trade-off da intolerância:
Ou toleramos o mundo tal qual é (com todos seus horrores,
incluso os que sofremos), ou sempre acabamos por ser intolerantes com algum
tipo de pessoa: se admitimos que o mundo não vai bem, acabamos caindo na
tentação de explicar o porquê disso, e ao fazê-lo inevitavelmente alguém será
vilanizado. A única forma de “não ser intolerante” é não culparmos ninguém, o
que deriva de não reconhecermos que as coisas vão mal no mundo, o que significa
tolerá-lo tal qual ele é, incluso com o nosso próprio sofrimento pessoal.
Trade-off da (des)crença:
Se somos adeptos de uma crença, por um lado acreditamos que
o mundo pode ser melhor do que é e que o (nosso) sofrimento tem algum sentido,
porém entramos em dissonância cognitiva toda vez que nos deparamos com
evidências de que essa crença não se sustenta.Muitas vezes essa evidência vem
na simples existência de alteridades tão ou mais funcionais do que a nossa mas
que não compartilham de nossa crença. É essa dissonância cognitiva ante nossas
verdades (que queremos absolutas) que está na origem dos conflitos ideológicos:
queremos calar o outro para, em eliminando-se a sua alteridade, forçarmos as
evidência em prol da crença que professamos. A intolerância é consequência da
tendência à confirmação inerente à qualquer crença.
Se somos niilistas, céticos radicais de dispensam qualquer
crença como ilusória em um mundo sem remissão possível, não entramos nesse tipo
de conflito, porém estamos condenados a (tentar) viver sem um “sentido” para o
(nosso) sofrimento. Dado que as crenças possuem efeitos sedativos ante o
mal-estar inerente à existência, não é impunemente se pretende viver sem
crenças.
22/09/2016
No meu
"passado marxista" eu tendia a acreditar muito mais no "poder de
manipulação" da mídia, no sentido de imaginar q é ela que torna as pessoas
medíocres. Hoje em dia, vejo essa mediocridade como estrutural da e funcional
para sociedade, construída antes de mais nada pela assimetria de apropriação
dos valores de uso, e em segundo lugar como decorrência superestrutural da
manutenção do establishment plutocrata. Mas não se trata de mera conspiração de
um grupo de pessoas más: em última instância, tudo isso é decorrente de nossa
natureza animal eternamente insatisfeita e contraditória por excelência. A
relação entre mídia e público na produção da mediocridade é dialética: a mídia
oferece o que as pessoas querem e as pessoas aprendem a querer o que a mídia
oferece (um conteúdo basicamente escapista, pautado por uma fuga permanente da
realidade - o que desde sempre acompanha a humanidade, vide a religião). Hoje
em dia, mesmo com muita informação qualificada disponível gratuitamente na
internet, as pessoas escolhem a mediocridade. Transformaram voluntariamente o
YouTube em uma TV ,
etc. Não é culpa só dos Illuminati não, rs
As pessoas não
querem saber a verdade, não querem se comprometer com uma investigação sobre
esse assunto. Mas ao mesmo tempo querem opinar e ter razão sobre tudo. O
espetáculo de mediocridade intelectual dentro e fora das redes sociais não
poderia ser outro com seres humanos assim
Esses problemas
decorrentes da assimetria na apropriação de valores de uso supostamente
poderiam sumir se tivéssemos alta tecnologia para diminuir a escassez desses
valores. Ocorre que com o avanço da tecnologia avançam também as possibilidades
de desejos que podem ser realizados, de tal forma que a escassez continua
praticamente a mesma. Isso porque cada um de nós tem uma capacidade inesgotável
de desejar. Assim sendo, nenhum progresso tecnológico será um dia suficiente
Portanto,
enquanto houver "povo" e "massa", vai haver essa
mediocridade. Só poderemos nos livrar, como civilização, do povo e da massa,
quando todo o 'trabalho duro", medíocre e mecânico tiver sido autorizado.
Mas aí o que fazer com bilhões de pessoas sobrando? Fora os impactos ambientais
da tecnologia... Enfim, eu não acredito na possibilidade de "solução"
para esses impasses. As utopias políticas são a versão societal do "objeto
a" lacaniano que nos move à ação. São por definição inatingíveis
Acredito que a
mediocridade continuará mesmo com alta tecnologia - vide as sociedades em Star Wars - e que, cedo
ou tarde (mais cedo do que tarde), nossa civilização ruirá (e mesmo nossa
espécie será extinta) muito antes de conseguir sair desse planeta
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